31 outubro 2006

Recesso

Por motivos particulares, este blog entra em recesso hoje até janeiro do ano que vem.

Quem me conhece sabe o motivo. Nada sério. Apenas preciso de todo o tempo possível para completar uma tarefa sumamente importante. E cada post aqui me toma horas de reflexão, pesquisas, burilamento textual. O que faço sempre com grande alegria e prazer, mas tenho estado culpada por deixar a tarefa de lado.


Você pode continuar postando comentários. Há muita coisa para se ler. Aliás, você já deu uma olhadinha na coluna à direita? Alguns artigos ali estão entre os textos de que mais gosto.

Tenho uma mailing list em que aviso sobre as postagens. Se quiser ser incluído nela para saber quando o blog entrará de novo na ativa (entre janeiro e fevereiro), você pode escrever seu mail nos comentários que enviar a este post. Eu os recusarei para que seu endereço não seja divulgado, e o incluirei na mailing list.

Mal posso esperar para voltar a escrever no blog sem culpa! :-)

Aos leitores queridos (eles sabem), um grande abraço e até o ano que vem!

Norma Braga


P.S.1 Não deixe de ler dois de meus blogs preferidos: Reinaldo Azevedo (que está animadíssimo no papel da oposição) e O Tempora, O Mores (sempre pertinente em teologia).
P.S.2 Se houver algo importante que eu não consiga deixar de registrar aqui, o recesso será rompido. Mas apenas em caso especialíssimo.
P.S.3 E que Halloween, que nada! VIVA O DIA DA REFORMA!

28 outubro 2006

Contra Lula, confiem no polonês

Sindicalista que se tornou Presidente da Polônia, Lech Walesa teria tudo para ser equiparado a Lula. Porém, não só as lutas de ambos estão em franca oposição, mas suas estratégias diferem de modo fundamental.

Por amor e não pela força

Inteiramente pacífica, a virada polonesa para a democracia já foi citada como uma das grandes vitórias sem o uso da violência de que se tem notícia na história mundial, ao lado da luta pelo fim do apartheid sul-africano (que só deu certo depois que se substituíram os tiros por boicotes econômicos) e norte-americano.

O caso norte-americano merece um parágrafo. Para acabar com a delimitação racista de espaços – e com a terrível tradição das placas em que se dizia “Proibida a entrada de cachorros e negros” –, o Rev. Lawson, pastor batista, bolou em setembro de 1959 uma incrível estratégia não-violenta: a ocupação silenciosa de lugares públicos permitidos apenas a brancos. Antes das ações, membros da igreja eram treinados durante algum tempo por voluntários brancos que se dispusessem a xingá-los e até empurrá-los, para que eles conseguissem ficar emocionalmente imunes às reações. O movimento cresceu, e foi tanta gente “invadindo” tranqüilamente restaurantes e lojas que, assim que a polícia, atônita, conseguia retirar dos locais aquelas pessoas mudas e quase inermes, uma nova e vasta leva tomava os mesmos locais minutos depois das prisões. Em menos de um ano, a segregação começou a ruir por si.

Com Lech Walesa não foi diferente. Em pleno regime comunista na Polônia, o cristão Walesa criou o movimento sindicalista Solidariedade para tentar restabelecer a democracia no país. (Observação: não confundir a acepção universal de “democracia” com o simulacro petista do termo, que geralmente significa “política revanchista com base no ódio de classes”.) Não foi uma “anti-revolução” por meio de armas, mas sim de um programa bem-sucedido de greves continuadas e muita mobilização popular. Mais tarde, ele diria em entrevista no Brasil que é muito mais difícil criar o capitalismo a partir do comunismo que o contrário. "O capitalismo não é um bom sistema, mas ninguém inventou coisa melhor", fez a ressalva. Essa tem sido também minha posição neste blog.

O fato é que Walesa foi coerente com seu anticomunismo e sua defesa do mercado. Quando assumiu a presidência, foi assessorado por Jeffrey Sachs, economista americano, para dar um verdadeiro “banho” de capitalismo na Polônia, de uma vez só: era a teoria do “big bang”, segundo Sachs. Assim, o presidente Walesa cortou todos os subsídios industriais, implodiu tarifas de importação, privatizou bancos e criou instituições capitalistas. Se o resultado imediato foi desastroso – a produção caiu, o desemprego dobrou – , hoje se reconhecem os resultados positivos dessas medidas: média de crescimento do PIB próxima a 5% ao ano, renda per capita de US$ 4,3 mil e inflação, que era de 70% ao ano, totalmente controlada, passando a 5% em 2001.

"Até hoje só a economia de livre mercado provou funcionar”, afirmou ele ao entrevistador brasileiro. “O que não significa que tudo nela seja bom. A sociedade polonesa não quer construir o capitalismo sem crítica. A Polônia quer fazer o sistema polonês, sem os erros nem do sistema capitalista, nem do socialista."

Quanto a Lula, Walesa declarou em 2005: "Eu previ que Lula seria presidente. Eu o conheço, nós já conversamos, mas sempre caminhamos em direções contrárias." Acrescentou ainda, inequivocamente, que Lula quer implantar o comunismo no Brasil.

É estranho que tantos brasileiros se recusem a acreditar em algo que um ex-sindicalista, expert em assuntos de comunismo, afirma com tanta tranqüilidade e certeza. Os dois se conheceram em 1981 em Roma, e Walesa já falara a Lula sobre sua aversão a regimes comunistas, sem encontrar eco no sindicalista brasileiro.

De lá para cá, Lula também tem sido coerente em seu comunismo. Dizem que a política econômica ainda não sofreu mudanças significativas, mas são muitas as atitudes do governo brasileiro que corroboram o totalitarismo sempre presente nesses regimes: o centralismo, o aparelhamento do Estado pelo partido, as políticas restritivas para calar a oposição – proposta da ANCINAV, controle da internet, ameaças e sanções a jornalistas como Boris Casoy, repressão ao homescholing, compra de deputados e veículos de comunicação – e o mistério que cerca casos como o assassinato do prefeito petista Celso Daniel, que segundo a própria família foi “apagado” por se recusar a participar de um esquema de corrupção. Essa história é especialmente horripilante: boa parte da família de Daniel mudou-se para outro país e nada menos que sete testemunhas morreram em circunstâncias estranhas. Isso tudo é conhecido do país, mas uma nuvem de silêncio e indiferença paira sobre esses fatos.

Se tudo indica que Lula será reeleito, este post é uma tentativa de contribuir para que o brasileiro pense ainda mais uma vez antes de colaborar para a reeleição de um homem no mínimo controverso, não só figura de proa em um partido que não conhece limites para se manter no poder – e dificilmente alheio a seus métodos escusos – , mas defensor de um regime que a tantos calou e matou através da história, ao lado de expoentes como Fidel Castro e Hugo Chávez. Se você preza pela verdadeira democracia, aquela que não usa de força nem desonestidade e tampouco criminaliza a expressão individual, não vote em Lula.

Leia ainda: Cem motivos para não votar em Lula. Os itens em vermelho são os fatos que se correlacionam mais intimamente com o totalitarismo comunista.

20 outubro 2006

A multidão manda pular

Não temais, nem vos assusteis por causa desta grande multidão,
porque a peleja não é vossa, mas de Deus.
(II Crônicas 20:15)
A fé cristã exalta o indivíduo que resiste ao contágio vitimário.
(René Girard)
Conselho sábio, o de David Bowie:
Não dê ouvidos à multidão, ela manda pular.

Hoje, o pensamento de esquerda é obrigatória unanimidade, e a simples menção favorável à “direita” ou o mais leve sinal de recusa a conteúdos sinistros, mesmo quando acompanhados de argumentos, atraem reações padronizadas: “nazista”, “fascista”, “reacionário”. É quando a boca se presta a obedecer ao automatismo de uma programação feita em tempos imemoriais, na escola, na mídia. O sujeito que pronuncia os impropérios não se dá conta do despropósito de chamar de seguidor de Hitler ou Mussolini, ou retrógrado, quem quer que denuncie a imposição estatal sobre a liberdade individual ou reclame do domínio de mentes e corações por uma ideologia monocromática, cega para a singularidade e para as nuances. Diante de alguém único, a ideologia de esquerda sempre mandará exclamar: antes de ser humano, você é pobre, ou mulher, ou negro, ou gay, e deve servir aos interesses da luta de classes, do feminismo, da ação afirmativa, do politicamente correto.

Satisfeito por “pertencer”, quem recebe esse mandato se refestela na agradável sensação de conforto e legitimidade que o grupo confere, servindo como simulacro de família e causa ao mesmo tempo. Não é nem necessário estar filiado a um algum partido de esquerda: de fato, a pressão mais eficaz é a distraída, impensada, fiel a regras quase indefiníveis. É assim que o corpo do militante inconsciente reverbera a reação aprendida com sincera indignação, o que deixa o outro ainda mais confuso. A repetição das palavras a cada idéia expressa – nazista, fascista, reacionário;nazista, fascista, reacionário – só condensa no espírito do alvo dissidente a óbvia conclusão: superou-se o regime totalitário explícito, que usa violência física, pelo regime totalitário implícito, por meio da programação mental (neurolingüística?). Cada cidadão se torna, nessa segunda modalidade, o vigia e cruel verdugo do outro, tal como no mundo imaginado por George Orwell. Facilmente manejável, a multidão é uma força imbatível contra o indivíduo, que pode recuar por puro mecanismo de auto-sobrevivência emocional.

Mas a Bíblia não é coletivizante. Pelo contrário, nela se denunciam as coletividades como fomentadoras da uniformização do mal. Em Êxodo 23: 2, Deus diz: “Não seguirás a multidão para fazeres o mal; nem numa demanda darás testemunho, acompanhando a maioria, para perverteres a justiça.”

De fato, a multidão estava presente como força coativa na negação de Pedro; estava presente para mandar matar Jesus aos alegres gritos de “crucifica! crucifica!”. A multidão está sempre presente quando alguém arrisca suicidar-se pulando de um prédio. É quando todos gritam: “pula!”.

Para desafiar o impulso homicida da multidão, Deus nos alcança individualmente, através da vitória pessoal de um único, Jesus Cristo. Em João 16:33, Jesus diz: “No mundo tereis aflições, mas eu venci o mundo.” O “mundo”, força uniformizante do pecado, é confrontado por sal e luz (Mateus 5:13-15): a luz ilumina e dissipa mentiras, dissimulações, confusões mentais; o sal não só dá sabor, transformando a adesão automática em firmeza de postura, mas, em pleno mundo caído, impede o avanço da destruição.

Mas isso só é feito a partir da renovação interior – “novo nascimento” – que o próprio Cristo opera em cada um que se propõe a colocar sua vida nas mãos Dele, a única autoridade absoluta e boa. Nele, nós nos libertamos do poder que as multidões têm sobre nós, pois só Ele é nosso mediador com o Pai, mais ninguém. Nele, não somos engolidos pelo grupo: o equilíbrio entre individualidade e vida em comunidade é restaurado pela unidade em Cristo, na medida em que, ao imitá-Lo, não estamos mais submissos ao imperioso impulso de ser igual ao outro para pertencer. Somos de Cristo, e isso nos basta. A programação uniformizante perde assim seu sentido, sendo substituída por vida verdadeira.


Leia mais:
Entrevista sobre René Girard e o desejo mimético

15 outubro 2006

Da série Posts Comentados I – Ed René Kivitz

Por trás das tragédias

Fiz visitas pastorais a duas mulheres que vestem luto. Lá pelas tantas uma delas disse entre lágrimas: “Deus deve ter as razões dele para levar meu filho, mas está difícil de entender”. Após um silêncio cauteloso e respeitoso, perguntei se ela considerava a possibilidade de Deus não ter tido razão alguma na morte de seu filho. Ela aquiesceu e enxugou os olhos, como quem diz, “é, você tem razão, Deus não tem nada com isso”.

O quadro que Ed René nos apresenta nesse post é mesmo desalentador. Tendo sofrido males semelhantes, no momento da tragédia penso: eu confiava em Deus, mas Ele permitiu que coisas horríveis acontecessem comigo, tal como permitiu a Jó – morte de parentes, destruição do meu corpo por meio de doenças ou acidentes, perdas financeiras devastadoras, encontros com pessoas que puseram minha vida de cabeça para baixo e quase me levaram à loucura. Tais coisas acontecem mesmo com quem coloca sua confiança Nele, é o meu escândalo.

O momento me apresenta duas opções. Na primeira, eu me conformo com minha ignorância: Deus é soberano e eu não conheço Suas razões. Mas O amo, e um dia saberei. Precisarei de paciência e uma confiança quase cega – semelhante à que levou Abrãao ao monte com seu único filho para ser sacrificado a Deus, que o pedia; semelhante à que levou Jó a não seguir o conselho cruel de sua esposa, “Amaldiçoa Deus e morre”; semelhante à de Paulo quando foi preso, chicoteado, desprezado até por irmãos de fé. Em tudo isso, entrego o sentido da minha vida Àquele que a possui, Àquele que a tudo possui.

Nessa primeira opção, descanso nas palavras sagradas:

“Porque o domínio é do Senhor, e Ele reina sobre as nações” (Salmos 22:28): Deus é o Senhor da história. Se Ele sabe administrar as nações, quanto mais minha própria vida, pois sou Dele.

“...no teu livro foram escritos os dias, sim, todos os dias que foram ordenados para mim, quando ainda não havia nem um deles” (Salmo 139:16): Em Deus - criador e não criatura, único habitante da eternidade, para quem não há tempo - , todos os dias de minha vida estão debaixo de Seus olhos. Portanto, quando não compreendo por que o mal me sobrevém, espero, e deixo que minha vida faça sentido Nele.

“Não se vendem dois passarinhos por um asse? e nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai. E até mesmo os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Não temais, pois; mais valeis vós do que muitos passarinhos” (Mateus 10:29-31). Jesus nos dá a garantia de que mesmo os menores fatos de nossa vida – simbolizados aqui pelos “cabelos contados” – estão debaixo do domínio do Pai.

“Tenho-vos dito estas coisas, para que em mim tenhais paz. No mundo tereis aflições; mas tende bom ânimo, eu venci o mundo” (João 16:33). Jesus não nega que o sofrimento virá, mas garante a vitória final por causa de Sua vitória. Deus não deseja intencionalmente que o homem sofra, mas vivemos em um mundo caído: nem Seu próprio Filho foi poupado de passar por aflições. Nossa garantia não é a ausência do mal, mas a vitória final do bem, garantida na vitória de Jesus sobre os poderes das trevas e sobre o mal maior, a morte.

Porém, há a segunda opção: declarar que Deus não é soberano e que Ele fechou os olhos no momento da minha tragédia, deixando-me sem proteção alguma, entregue a um mal sem sentido. Acolho assim, nessa hipótese, um Deus menor que meu próprio pai terrestre – que, se pudesse ter feito algo para evitar minha dor, não hesitaria. Assim, o autor dessas linhas diminui Deus ao dizer:

Assim acredito. Afirmar que Deus tem lá suas razões por trás das tragédias equivale a atribuir a Deus a causa de tais tragédias. Algo como Deus decidir dia e hora de virar nosso mundo de pernas para o ar, movido pela firme convicção de que tem algo a nos dar ou ensinar ou um lugar onde deseja chegar às custas de nosso sofrimento.

Afirmar isto é negar o Senhor da história. Ora, Ele não é a causa das tragédias: o mal que veio ao mundo por causa do pecado, sim. O papel de Deus em um mundo caído não é retirar todo mal deste mundo imediatamente – isto é para o fim dos tempos – , mas sim administrá-lo segundo seus desígnios, aos quais muitas vezes não temos acesso.

A pergunta que me faço é, afinal de contas, o que Deus quer fazer em mim, comigo, por mim, através de mim ou contra mim que pode ser mais importante do que a vida do meu filho? Não encontro qualquer resposta suficientemente razoável para acreditar que Deus precise sacrificar vidas por minha causa. Aliás, Deus já sacrificou a única vida que precisava de fato ser sacrificada por minha causa. O Calvário foi testemunha.

A vida de Jesus foi sacrificada aos homens desde a fundação do mundo, não só para que a criação fosse garantida após da queda, mas para que houvesse redenção. Crer em um Deus que não administra o mal nas vidas individuais também é crer em um Deus impotente para livrar o mundo inteiro do mal. Ou Ele é soberano de verdade, ou não é Deus. A vinda de Seu Filho é o fato mais importante que atesta Sua soberania: Ele sabia que o mal e a morte entrariam no mundo por causa do pecado e providenciou sua retirada. É quando nos convida para desviar os olhos das tragédias que ainda ocorrem e contemplar a redenção final – algo difícil, sim, mas não impossível. É por Sua graça que recebemos as palavras de Jesus: “Tende bom ânimo, eu venci o mundo.”



Negar a soberania de Deus porque não entendemos o que nos acontece é o mesmo que dizer: "Se não entendo o sentido disso, é porque não há." É sobretudo admitir a falha de Deus: não na causa do mal, mas na ausência.

Essa recusa de reconhecer e descansar na incognoscibilidade dos desígnios de Deus é muito emblemática no Livro de Jó. Depois que os amigos de Jó tentaram convencê-lo de que seu sofrimento se devia a pecados ocultos, Deus se revela e diz a eles: "não tendes falado de mim o que era reto" (Jó 42:7). O que exatamente não era reto nas palavras dos amigos? Eles diminuíram Deus ao dizer que Ele só agiria em correspondência aos atos de Jó. Em suma, é como se tivessem dito que Deus só poderia agir assim: "Se fores bom, Ele te abençoa; se fores mau, Ele te pune." Crendo assim, tornavam a independência de Deus em dependência do homem, como se Deus só agisse em conformidade com o que o homem faz. Negavam assim não só a existência do Deus da graça comum, que "faz chover sobre justos e injustos" (Mateus 5:45), mas do próprio Deus da redenção: se Ele premia os bons e pune os maus, não há esperança para os maus, e todos somos maus - eis a verdade do pecado original que ressurge com força em Paulo: "Todos pecaram, todos carecem da glória de Deus" (Romanos 3:23).

Por isso Deus se revela em toda a Sua força e poder para Jó, que exclama: "...falei do que não entendia; coisas que para mim eram demasiado maravilhosas, e que eu não conhecia. (...) Com os ouvidos eu ouvira falar de ti; mas agora te vêem os meus olhos." (Jó 42:2-5) A visão de Jó sobre Deus ganha assim um foco mais acurado: Ele é muito maior que nossas ações humanas, e age conforme crê necessário. Não tem prazer no mal, mas o administra de um modo que "tudo coopera para o bem daqueles que amam a Deus" (Romanos 8:28). Essa é nossa real esperança diante do sofrimento.

"Falei do que não entendia; coisas que para mim eram demasiado maravilhosas, e que eu não conhecia": que o autor do blog "Outra Espiritualidade" possa um dia exclamar isto a Deus, é minha sincera oração.

09 outubro 2006

A história se repete: Outra Espiritualidade

Quando os arquifamosos pregadores Ricardo Gondim e Ed René Kivitz abriram um blog chamado Outro Deus, com fumaças de Teísmo Aberto e outras distorções teológicas, escrevi alguns comentários, exercendo ali uma quase solitária discordância e sinceramente esperando por respostas. Uma semana depois, qual não foi a minha surpresa quando fecharam o blog, alegando não terem sido compreendidos (a história toda está aqui e aqui).

Hoje de tarde, dia em que trabalho em casa, Gustavo Nagel me escreveu sobre o novo blog do Ed René Kivitz, Outra Espiritualidade (é uma verdadeira obsessão essa coisa do outro), para mostrar os comentários dele e do André Scordamaglio, além da reação das kivitzetes de plantão. Animei-me e resolvi postar um comentário também, com algumas perguntas. Qual não foi a minha surpresa quando, apenas horas depois, Gus me chama no messenger para dizer “Ele acabou com os comentários!”, em um post chamado Bem-vindos à mesa. A contrapartida nada sutil é que os que chegam para questionar não são bem-vindos. Bonito, hein?


Bom, os fatos falam por si. Mas não resisto e acrescento: tanta insistência em “outro” – “Outro Deus”, “Outra Espiritualidade” – e tanta adesão ao discurso moderno da alteridade não significam nada para nenhum dos dois. Quando se trata de pôr as idéias à prova e confrontar mesmo os “outros outros” que eles rejeitam, Gondim e Kivitz fogem correndo da raia, mostrando que não pretendem retribuir a mesma abertura que advogam para si. Apóiam-se em declarações como a de Brennan Manning, “amar aos outros independentemente de religião ou cultura”, mas, na hora de um simples confronto de idéias por internet, agem como puros stalinistas, limando peremptoriamente do território deles a palavra do argumentador que incomoda. Depois, queixam-se do tratamento que recebem do meio evangélico, dizendo-se “vítimas do sistema” em seus artigos. Ou seja, produzem repetidamente um discurso provocador contra o status quo tradicional protestante, ganhando ampla adesão por isso (hoje em dia, o “rebelde” tem fama imediata), mas não são corajosos o suficiente para sustentar as bravatas teológicas em seus próprios blogs - algo que qualquer seminarista de vinte e poucos anos consegue fazer. É assim que querem pregar sobre alteridade?


Mas chega de lenga-lenga e vamos aos textos:

Nosso destino (posto na íntegra porque, nunca se sabe, Kivitz pode ainda querer acabar com o blog):

Uma das coisas mais estúpidas que já acreditei em termos de religião foi que a composição da população do céu podia ser mensurada pelo número de pessoas que dissessem sim a um apelo de conversão a Jesus Cristo feito nas bases da tradição do cristianismo protestante evangélico anglo-americano. Traduzindo: se você acredita que irão para o céu somente as pessoas que aceitam a Jesus como salvador depois de ouvir o evangelho pregado a partir da cultura anglo-americana, então você está em apuros: o seu céu é pequeno demais; o seu Deus é pequeno demais; o seu Cristo é pequeno demais; o seu evangelho é pequeno demais; o seu Espírito Santo é pequeno demais; o seu universo de comunhão é pequeno demais; seu projeto existencial é pequeno demais; sua peregrinação espiritual é pequena demais.É urgente que se articule uma outra maneira de convocar pessoas para que se coloquem a caminho do céu. Uma convocação que considere que “nem todo o que me diz Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade do meu Pai que está nos céus” – palavras de Jesus. Uma convocação que re-signifique o conceito de céu, que deve deixar de ser um lugar geográfico em outro mundo para onde se vai após a morte, para significar uma dimensão de relacionamento com o Deus Eterno para a experiência contínua do processo de humanização: estar em Cristo, ser como Cristo, ser Cristo. Com isso quero dizer que o convite para aceitar Jesus como salvador como credencial para ir para o céu não é a melhor convocação. A melhor convocação é um chamado para se tornar uma outra pessoa. A peregrinação espiritual cristã não é uma migração de um lugar para outro, mas de um estado de ser para outro. Nosso destino não é o céu. Nosso destino é Cristo. E tenho certeza de que muita gente vai chegar lá mesmo sem nunca ter ouvido o plano de salvação desenvolvido pelos teólogos sistemáticos anglo-americanos.

Meu comentário (que refiz de cabeça):

Para mim, foi uma surpresa negativa o fim do blog Outro Deus, onde postei algumas perguntas que jamais foram respondidas. Parece que Gondim e Kivitz, seus autores, não costumam ser como a maioria dos blogueiros. Porém, se Kivitz comparecesse aqui para dialogar com seus leitores, eu lhe faria algumas perguntas:

- O que é exatamente “o evangelho pregado a partir da cultura anglo-americana”?

- Será mesmo que todo mundo na igreja pensa que o céu é um lugar? E, ainda que isso seja verdade, a Bíblia não dá margem para isso nas próprias palavras de Jesus: “Irei preparar-vos lugar”, “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso”? Assim, qual seria a vantagem de suprimir essa interpretação de “lugar”, já que a outra, de mudança interior na conversão e presença de Cristo, também é abundante na Bíblia?

- Considerando que "aceitar Jesus como salvador como credencial para ir para o céu" é uma simplificação da conversão cristã (e não acredito que muitos neguem isso), você não acha que sua proposta para um melhor chamado, "para se tornar uma outra pessoa", é redução maior ainda, por confundir-se com a transformação interior que todas as religiões costumam reclamar para si? Não estaria, assim, advogando a troca de uma simplificação por outra menos rica ainda e de difícil identificação com a fé cristã? A salvação ainda se relaciona com a necessidade de arrependimento; a transformação interior é apenas uma necessidade íntima, subjetiva, que não se associa a uma dívida real que temos com Deus por causa do pecado. Será que sua proposta de mudança discursiva não aponta para uma rejeição dessas noções básicas do cristianismo?

Não tenho como especular muito sobre a teologia kivitziana e seu possível distanciamento do cristianismo bíblico. Porém, tenho todo o direito de perguntar: será que a ausência de resposta à última pergunta significa um relutante "sim"? Como saber com certeza, se o autor do blog se recusa ao diálogo? E sim, para todos os efeitos, isso aqui é um desafio ao debate.

04 outubro 2006

James Houston ao vivo na internet


James Houston é um dos pensadores evangélicos que mais admiro, e realmente o tenho como um grande modelo. Muito erudito, trabalha com o que chamamos de cosmovisão cristã e crítica da cultura, um terreno ainda pouco explorado pelos evangélicos. Suas palestras costumam ser um verdadeiro caldo grosso de explanação teórica dos autores mais importantes de todos os tempos. Realmente não creio que o mundo evangélico hoje conte com alguém como James Houston. Ele se assemelha a um C.S. Lewis quanto à apologética e à relevância universal das grandes questões humanas, sempre presentes no que diz ou escreve.

Apesar da idade avançada e da saúde frágil, ele sempre viaja ao Brasil para conferências. Está esses dias em São Paulo para palestras a partir de hoje, às 16h, até o dia 6 de outubro. E essas palestras serão transmitidas ao vivo pela internet, através do site http://www.lifestream.com.br, sempre nos mesmos horários:

Dias 4, 5 e 6 de outubro
início 16h
retorno do coffee-break às 18h
intervalo às 19:00
retorno às 20:00
final 22:30

Não perca a chance ímpar de ouvi-lo! E depois venha postar comentários aqui.

02 outubro 2006

Post comemorativo pós-eleições


A capa de Veja que todos gostaríamos de ver.

Vamos às boas notícias!

Jandira Feghali perdeu, e perdeu feio, para Dornelles: 45,86% contra 37,54%. Já era uma senadora a favor do aborto! Viva!!!

Gosto de pensar que o Flor ajudou nesse feliz resultado, mas creio mesmo que foi a repercussão negativa do episódio do Arcebispo do Rio de Janeiro que empurrou Jandira ladeira abaixo. O povo brasileiro não gosta dessa história de aborto por qualquer motivo, e o atentado à liberdade de expressão religiosa só contou pontos contra ela. Bem-feito! Foi conseqüência do próprio veneno. Que sofra ainda muitas derrotas políticas e nunca, jamais, tenha a chance de ver implementado aquele nefasto projeto. É minha sincera oração.

Outro motivo para festa é o segundo turno para presidente! Em média com 48% dos votos contra 40% para Alckmin, Lula terá de se conformar em competir uma segunda vez. Ufa!

Para presidente, os números da última apuração a que assisti impressionam: Lula perdeu de lavada no Sul (54,9% X 34,9%) e no Centro-Oeste (51,6% X 38,5%), mas é suplantado com pouca diferença por Alckmin no Sudeste (45,2% X 43,3); analistas na TV já falam em maior "frouxidão moral" nessa região. O petismo por aqui é um monstro difícil de abater, principalmente entre a elite universitária; mas eu ainda espero que esteja agonizando. Já no Norte e no Nordeste, Lula tem perigosas vitórias (56,1% X 36,2% e 66,7% X 26,1%), o que só prova a tendência populista desse governo (que alardeia ser "mais fácil governar para pobre") e a importância da internet. Se essas duas regiões não fossem as mais pobres do país - e portanto sem a cultura da internet - , duvido que haveria tal resultado. Isso, sem contar com a triste realidade dos votos de cabresto.

No total, porém, excelentes notícias para nós, conservadores. Quanto à derrota de Lula, não custa sonhar e manter a esperança. Continuemos pedindo a Deus para zelar por nosso país.
Notinha maldosa mas necessária: Deu na imprensa que uma manifestante idosa (60 anos) está agora à noite (uma hora da manhã) em frente ao Palácio da Alvorada, protestando contra "a lama do governo", segundo declarou. Aborrecendo e assustando a pobre senhora, um carro prateado cheio de bandeiras e adesivos do PT fica dando voltas em torno dela, fazendo-a gritar com medo de ser atropelada. Que vândalo! Bom, pensando bem, só podia mesmo ser coisa de petista: falta de respeito aos mais velhos, descaso com a vida dos outros, encheção de saco e muita movimentação sem sair do lugar. Eu disse petista? Comunista-socialista!

01 outubro 2006

A lógica torcida do aborto

Precisa debater com um defensor do aborto? Deixa eu dar umas dicas aqui.

Dentre os argumentos existentes para mascarar a crueldade do procedimento, o mais utilizado é aquele que afirma a impossibilidade de se saber a partir de quando o feto pode ser considerado “gente”.

É um disparate em toda a linha. Ponha de lado as elucubrações sem fim sobre óvulos e as novas descobertas da ciência, e argumente assim:

- Mas vem cá, mesmo se não podemos determinar quando o feto pode ser considerado “gente”, vamos supor que a mulher não faça o aborto.

- Certo.

- Se correr tudo bem durante a gestação – e hoje em dia geralmente corre tudo bem – , o que acontece?

- ...

- Nasce gente depois de nove meses, não nasce?

- (Contrariado) Nasce...

- Então, se você fizer o aborto (não importa quando), gente deixa de nascer, não deixa?

- (Contrariadíssimo) Deixa.

- Qual a diferença então, se fizer agora ou depois? O resultado é o mesmo: alguém deixa de nascer. Se alguém deixa de nascer, quem comete aborto necessariamente suprime um ser do mundo.

Palavras fortes chamam a atenção para decisões fortes. Insista que abortar é o mesmo que suprimir um ser do mundo, e que isso é assassinato. E que ninguém deveria ter tamanho poder sobre a vida de outra pessoa, nem mesmo um genitor.

Foi por isso que um dia desses eu escrevi uma frase assim:

“Argumentar contra o aborto é colocar-se na estranha situação de tentar proteger um filho contra o impulso homicida dos próprios pais.”

Que Deus chame à responsabilidade os pais deste país, ainda que a lei brasileira um dia se posicione a favor dessa loucura assassina do aborto.