08 janeiro 2016

O filme cristão Quarto de Guerra



Semana passada, eu e André fomos ver um "filme cristão" - categoria que vem ganhando os espaços do cinema. Eis aqui minhas impressões. War Room (em português, Quarto de Guerra) não é um mau filme. Não é uma obra-prima artística, mas também não é perda de tempo. De forma geral, o Evangelho está presente, bem como a centralidade em Jesus. A história é interessante, os atores não fazem feio, as tiradas de humor - peculiarmente focadas em maus cheiros corporais - são eficazes e se integram bem ao todo. Há algumas pentequices, mas, como não sou uma reformada antipenteca, isso não me incomodou. No entanto, saí do cinema um tanto fustigada, como se a experiência tivesse sido negativa em algum nível que não consegui imediatamente compreender.

Esse artigo (em inglês) me ajudou a entender um pouco o porquê. Richard Brody aplica ao filme o termo "sanitizado" para referir-se à ausência total de balizas culturais na história. É algo que sempre me chateou, por exemplo, na série Friends, em que os personagens vivem em um vácuo inexplicável de leituras e arte. O mesmo ocorre em Quarto de Guerra. No contexto protestante, essa falta adquire um tom mais macabro, por causa do fenômeno descrito por Francis Schaeffer em O grande desastre evangélico e que eu costumo chamar, em minhas palestras, de "alienação": o cristianismo que se pensa ortodoxo (em contraposição ao sintético) meteu-se em um gueto cultural autodefensivo cuja crítica está apenas esboçada. No Brasil, muitas denominações ainda mantêm seus membros afastados de músicas, filmes, livros etc. considerados "do mundo". Quarto de Guerra não defende essa postura, mas também não desafia as fronteiras do gueto - e uma das consequências desse alheamento é apontada pelo autor do artigo muito acertadamente: a descrição pobre do mal, com seus atrativos e suas profundidades. Sim, Jesus salva - mas do quê? No que consiste a luta cristã? Quarto de Guerra faz parecer tudo muito simples e rápido, e a isso reagi mal emocionalmente, pois nada foi simples e rápido na minha vida cristã; muito pelo contrário. Assim, saí da sala sentindo o desconforto de um filme que representa pouco minha vivência e a de incontáveis outros cristãos.

Daí minha ênfase na descrição mais acurada do mal - no caso, da idolatria - que foi todo o objeto de minha dissertação de mestrado em Teologia Filosófica no Andrew Jumper.

17 comentários:

Unknown disse...

Só para eu entender a crítica, o problema seria a superficialidade Norma?

Norma disse...

Sim, creio que esse termo cabe. Uma visão superficial do pecado, do mal humano.

souzatransportes disse...

Infelizmente, creio que vamos ter que nos contatar com esses filmes clichês por muitos anos. As razões são óbvias: falta gente preparada teologicamente no mundo do cinema; e esse tipo de filme é que dá bilheteria.

Ricardo Marques disse...

Norma, gostei MUITO do filme e até me emocionei. Sou assim mesmo. Contudo, saí dele com essa mesma impressão que você teve, até comentei com minha esposa e meu filho no carro. A rapidez e aparente facilidade como as coisas acontecem no filme distanciam-se da realidade prática do exercício da fé cristã... Por outro lado, em um curto tempo de menos de 2 horas me parece difícil que se consiga representar essa realidade de que falamos...

Filipe Malafaia Cerqueira disse...

Olá, Norma, achei muito interessante o seu ponto de vista. Parece que os personagens realmente vivem em um gueto cultural, sem acesso ou interesse em nada mais além de suas próprias vidas e crença. Não tinha parado para pensar nisso. Ainda assim, amei o filme, que é um bom motivador para que todos vivamos uma vida de oração e busca da vontade de Deus. Convido-lhe a ler a minha resenha sobre o filme em: http://popcinemais.blogspot.com

Abraço!

Kelly Oliveira Barbosa disse...

Bom artigo! Não assisti esse filme ainda, mas já me indicaram. Gostei das suas impressões. Acho sempre muito interessante as suas reflexões sobre o cristão e a cultura.

A superficialidade é um grande mal.
Bjim

Unknown disse...

ASSIM COMO VOCÊ NÃO SOU ANTI-PENTECA , MÁS ACHEI O FILME COM MUITAS INCOERÊNCIAS, UMA MENSAGEM MUITO CONTAMINADA COM O IMEDIATISMO DE NOSSO TEMPO
ME RECUSO A ACREDITAR QUE DEUS INTERVIRIA PARA LIVRAR ALGUÉM QUE ROUBOU DE IR PARA CADEIA, CLARO QUE NÃO DUVIDO QUE DEUS A PERDOARIA, E POR FIM O QUE MAIS ME INCOMODOU FOI TER QUE ESCUTAR DUAS HORAS DE LABAXURIAS E CHAVÕES PENTECOSTAIS DENTRO DE UMA SALA FECHADA, KKKKK SOFRÍVEL !

ppmbruno disse...

Olá Norma!
Como em outros filmes do Kendrick brothers, já fui com pé atrás sobre produção, roteiro, interpretação (tenho certeza que 100% dos figurantes são membros da congregação deles kkk) e profundidade bíblica, mas War Room me agradou bem mais do que os outros!

Sim ele é superficial, mas não podemos negar que é prático! Confesso que sai com o coração incendiado!

Curti demais sua review e fico feliz de saber que você foi com seu esposo ver esse filme no cinema! (tá vendo, nerd não assiste só Star Wars)

;)

Unknown disse...

Olá Norma.

Assisti o filme e gostei muito.
Levei minha mãe, que ainda não professa a fé evangélica e a resposta dela ao filme também foi muito boa.
Não achei superficial, ou simplista, creio que da forma que foi feito alcançou um público bem diversificado.
Abordou questões muito importantes (oração, família, ensino, unidade, firmeza na fé etc) e de uma maneira prática dá uma noção que há um mundo espiritual. Já abordava esse tema com minha mãe, buscando levar a Palavra a ela.
Há pontos fracos?
Com certeza. Mas isso ao meu ver, não diminui ou atrapalha o principal que é ser instrumento de instrução e alcance de almas.

Abraço. Paz.

Unknown disse...

Apesar de ser um filme mais dentro da realidade americana, Achei ele muito bom. Acho que a critica no fato do "facilidade" da mudança não faz tanto sentido. Uma porque não foi tão simples. Outra é que roteiro tem uma bela de uma cereja, quando a senhora que era o exemplo no final conta, que com ela não foi tão fácil assim. E que na verdade no casamento dela ela viveu sim uma derrota. Agora falando de Tempo, Rapido ou Demorado ? 40 dias ou 40 Anos ? o que faz demorar ? Eu pessoalmente já vivi momentos onde o agir de Deus foi algo rápido, intenso... Outros não... já foram mais lentos... Porém o que determina isso ? Não tem regra, Deus age Rápido Sim! Mas o Tempo dele é diferente... Tem hora que pode demorar ? porém não sabemos explicar isso. Não tem como criar uma regra. Mas a grande questão é a nossa posição diante de Deus. E permanecer nela o tempo que for necessário. O Personagem poderia ter vivido uma história mais dramática, com mais tempo e sofrimento? sim poderia. Mas o fato de não ter sido, não faz o filme mais ou menos correto teologicamente correto.

gugitermino disse...

Olá ,

Achei interessante sua critica no ponto de vista da sua confissão e crença pessoal, porém cada individuo tem a sua experiencia e
a vida cristã de cada um é diferente e a forma do tratamento de Deus para com cada um é individual e unica.
não existe uma sistematização da ação de Deus e no tempo em que Ele opera. no seu caso pelo que li as coisas demoraram para acontecer ou foi de forma gradativa ou aos poucos. achei também interessante o termo que usa para se dirigir aos pentecostais, dando uma certa conotação de infantilidade generalizada.
tudo isso é fruto de sistematizações , programações , dando a parecer que o agir de Deus é melhor em determinado grupo de pessoas , ou baseando se em seu nível intelectual.
Outro ponto, estou lendo vários comentários sobre aspectos teológicos do filme, mas, qual teologia é a correta , novamente entramos na sistematização em que já estamos programados. a bíblia deveria ser a nossa regra de fé e comportamento !

Oswaldo Viana Jr disse...

Olá Norma, assisti o filme ontem. Realmente, a percepção do crítico da New Yorker é acuradíssima. A observação que ele fez sobre a decoração das casas é fantástica... De fato, o problema da alienação cultural dos "crentes" é vasto e profundo. Por outro lado, para o fim (e para o público) a que se propõe, é um ótimo filme, que por si só pode levar o público-alvo a se interessar mais por cinema, crítica de cinema, artes em geral. E um pensamento que me ocorreu ao refletir sobre o filme é: quando um cristão resolve entrar pra valer no "quarto de guerra", inevitavelmente ele irá (se tudo correr bem) travar uma séria guerra cultural na sua esfera de atuação, sem importar qual seja seu nível sócio-cultural. Como reza o dito, "Deus não escolhe os capacitados: ele capacita os escolhidos".

Abraços, e vamos todos para o quarto de guerra!

Paulo Pires disse...

Prezada Norma,

Que a ênfase do filme esteja na redenção, e não do mal redimido, não me parece um problema. Até porque, esse mal está todo lá: o ódio (ou, eufemisticamente, a falta de amor) pelos cônjuges, a sedução, o desejo de adultério -- que, segundo Nosso Senhor, adultério já é --, o roubo, a mentira, o orgulho, o descaso com os filhos e, por trás disso tudo, a falta de comunhão com Deus.

Também as pessoas não vivem fora do mundo. Eles vão à academia, compram sapatos, pulam corda, jogam basquete, malham, relacionam-se com irmãos, amigos e vizinhos, tomam sorvete. Não leem livros ou escutam música? Quem diz isso é Brody, não Kendrick (o mesmo Brody, aliás, que celebra a conversão à busca do “êxtase secular” de Paul Schrader). Ou será que Kendrick teria de mostrá-los dançando música “do mundo” para que a história seja verossímil?

Será que o problema é mesmo de falta de verossimilhança? Li noutro post que uma música de David Bowie ajudou você a começar a se desvencilhar de crenças que você tinha, num processo que culminou com sua descoberta do Deus verdadeiro. Graças a Deus porque Ele usa os instrumentos que quiser para converter a quem Ele quiser! Mas nem todo mundo tem a mesma vida e trajetória da Norma Braga. Se uma parte expressiva -- se não a maioria -- do nosso povo não lê, ou não entende o que lê, ou não presta verdadeira atenção às letras das músicas seculares que ouve, creio que o Justo Deus usará outros instrumentos com essas pessoas.

Existem cristãos como eu, que nasceram na igreja e que, mesmo tendo balançado um pouco durante uma fase da vida (os malfadados primeiros anos da faculdade), nunca tiveram de passar grandes agruras para voltar-se para Deus. Diante de muitos testemunhos de conversão impressionantes (alguns nem tão impressionantes assim) já me peguei a questionar a validade da minha conversão, tão mais simplória e sem sofrimentos. Bobagem! Eu tenho mais é de agradecer a Deus por ter me preservado do mal, e de agradecer e louvar também a Ele pelos meus irmãos que, apesar de turbulências -- ou mesmo por causa delas -- chegaram aos braços desse mesmo Deus.

Com todo respeito, pergunto se não é possível que você esteja fazendo o oposto, e desprezando narrativas mais simples que a sua simplesmente porque mais simples do que a sua.

O Evangelho é simples, mas não é necessariamente fácil, principalmente para quem está preso às coisas da carne. Não acho que Kendrick confunda sua simplicidade com ausência de dificuldades. É verdade que ele não enfatiza tais dificuldades, até porque o filme é também uma apologia e é um filme for all audiences, mas também não as omite totalmente (por exemplo, a personagem Danielle não muda completamente de uma hora para outra, e a própria Clara, no fim, confessa que odiou o marido durante a maior parte da vida, antes de realmente deixar que Cristo operasse nela um milagre como o que, depois, ela ajudou a operar na família de Danielle).

“Quarto de Guerra” não e um filme “cabeça”; estaria mais para filme “coração”. Mas não creio que seja um filme insultuoso à cabeça.

Norma disse...

Olá, amigos!

Tenho achado bacanas as reações positivas e as defesas animadas do filme que vocês leitores postaram aqui. :-) Que fique claro: eu gostei do filme. Mas, para mim, apesar de todas as positividades e dos elementos verdadeiramente bíblicos (pelos quais só temos a agradecer!), ele também não deixa de refletir algumas das características mais negativas do protestantismo moderno. Espero que eu não tenha incomodado demais os leitores dando maior ênfase nas negativas - acredito que precisamos ser críticos em relação ao nosso legado. Se eu fosse redigir um texto maior, um artigão, provavelmente essa proporção entre positividades e negatividades seria mais equilibrada.

Abraços a todos!

Norma disse...

P.S. Antes que vocês me achem uma crítica sem coração... Eu também me emocionei com o filme! É impossível ser cristão e não se emocionar com Quarto de Guerra. :-)

Unknown disse...

O Filme é muito bom, também conheca os livros relacionados ao filme, estou lendo e está sendo muito edificante na minha vida. Nesse site você consegue baixar grátis o primeiro capítulo de cada livro. www.quartodeguerra.com.br

Unknown disse...

Olá Norma! Eu li o livro antes de assistir ao filme e fiquei muito impactada, pois é claro que em um livro tudo é mais explicado e aprofundado! Quando vi o filme tbm senti a sensação de superficialidade, mas como li o livro antes, um completou o outro e fui grandemente edificada! Bjos
acabei de fazer uma pequena "resenha" sobre isso em meu blog auroraverbal.wordpress.com