Jesus Cristo personifica o único real e válido esforço de reintegração do ser humano consigo mesmo, com seu próximo e com Deus. Todos os demais são idolatria – e, dentre eles, a idolatria mais mortífera é aquela que nos faz tirar os olhos de nossas divisões internas para enxergá-las apenas externamente, como fruto de uma cosmovisão esquemática dualista-moralista totalmente arbitrária, composta de uma dicotomia rígida que se distancia da realidade. No cristianismo, o mal está no interior e é intrínseco à natureza humana desde a queda. No esquema dicotômico idólatra, o mal é apenas exterior, encarnando-se e cristalizando-se em todo aquele que não adere à cosmovisão. No cristianismo, todos nós somos opressores ou oprimidos dependendo de cada situação, mas sobretudo pecadores, porque o mal toma múltiplas formas. No esquema idólatra, o opressor tem sempre o mesmo endereço; é culpado por recusar-se à adesão e por toda forma de expressão pública dessa recusa.
O cristão se reintegra em Jesus, confessando-se pecador e recebendo perdão. O idólatra comunista, socialista e/ou politicamente correto jamais reconhece seu próprio mal, mas se sente reintegrado na doutrina que prega: acabem-se os opressores e o mundo será transformado. O cristão morre e ressuscita em Cristo; o comunista mata ou neutraliza o outro. Não há síntese possível entre esses dois antídotos para as divisões humanas. Se você se sente à vontade como cristão comunista, algo está errado. Das duas, uma: ou seu comunismo se resume a sentimentos legítimos mas mal direcionados de preocupação e solicitude com relação aos menos favorecidos – e você precisa compreender que comunismo não é isso – , ou você está usando as instituições cristãs como uma casca religiosa para embelezar aquilo em que crê de fato. No primeiro caso, alguém o enganou; busque informação. No segundo caso, você é um enganador, e terá de prestar contas a Deus naquele dia.
23 comentários:
Norminha, agora espere aparecer os sofismas: "eu sou socialista, Norma, não sou comunista" ou então "ah, mas devemos nos preocupar com o próximo, e vocês, da direita, são individualistas"...
Só quem sabe o que é uma ideologia, e aí se inclui também coisas tidas como da direita, como o liberalismo (não quando é estritamente econômico) e mesmo as manias dos neocons, sabe que nenhuma delas pode ser conciliada com o cristianismo, que possui uma cosmovisão plena (charlatões marxistas adoram confundir ideologia com cosmovisão) e não necessita de auxílio de construções racionalistas, meramente apriorísticas, para interpretar a realidade.Ainda mais quando tais postulados são descaradamente anticristões, como é o caso das ideologias coletivistas, como o fascismo, o socialismo, o nazismo, a tal da social-democracia, etc...
Um dia, essa miríade de líderes eclesiásticos brasileiros habituados a dar pitacos sobre tudo só porque lê jornal, house-organ denominacional e coisas como a Ultimato, vai entender isso. Eu creio. Creio em milagres.
Maya,
Já apaguei os comments (se você olhar o blog, irá ver que não estão mais lá), mas acho que tem de se esperar até que não apareçam mais na pesquisa do Google.
Edson,
Também creio. E faço minha parte para isso.
Estou para fazer um trabalho sobre "ideologia". Besançon e Furet dão definições bastante semelhantes para o termo. E adivinhe? Ambas têm a ver com idolatria.
De minha parte, a única idéia "de esquerda" que acho que tenho é que a Educação deveria ser pública e de qualidade para todos, assim como a Saúde.
Não condeno as instituições confessionais (Mackenzie, PUC, hospitais, etc). O que eu condeno é o lucro e comércio exacerbado em cima de Educação e Saúde. Estas duas áreas deveriam ser mais acessíveis, e com qualidade, para todos os seres humanos, independente de posição social.
Sou de esquerda por isso? Whatever, é isso o que eu penso... :-)
Abraços,
Cristiano.
Não, Cristiano, não acho que você é de esquerda por isso, pela simples razão de que nós pagamos impostos para esses serviços.
O triste é ver a situação dos hospitais públicos cada vez pior. Na minha família, a geração da minha idade nasceu toda em hospitais públicos de qualidade. Hoje, eles são praticamente inexistentes. A roubalheira em cima dos impostos corre solta e não há mecanismos que a impeçam. Isso significa centralização e abuso de poder. Na boca dos enganadores, todo o discurso da esquerda "pelos pobres" só serve para aumentar essa centralização, porque ela é máxima no comunismo.
Quanto às instituições confessionais, quero mais que existam, e em número cada vez maior. O que não suporto é gente que, dizendo-se católica ou protestante, dentro de igrejas e instituições cristãs em geral, é comunista e só trabalha pelo avanço das idéias comunistas. Isso é reflexo da velha estratégia soviética (e que agora se verifica na China, onde todo pastor ou padre tem que pertencer ao PC chinês): troquem-se os líderes religiosos por comunas em todo lugar. É o modo mais simples de solapar a fé. Infelizmente, a URSS institucionalizou a hipocrisia religiosa e muitos outros países a imitaram. É inacreditável, de fato, que alguém clame seguir a Cristo sendo comunista, mesmo sabendo que, no regime, a primeira providência é mandar os religiosos para os campos de concentração e substituí-los por compenetrados atores comunistas. Sobre essa estratégia de dominação de espaços, recomendo o excelente livro de Haralan Popov, Torturado por sua fé, editora Fiel.
Norma, fiquei muito feliz com a tua visita! Que saudade de te ler! Beijão!
Você provou porque os adeptos da Teologia da Libertação merecem ser excomungados...
Marxismo em Cristo? Não dá.
Parabéns!
Senhores Norma Braga e Edson Camargo. Eu tenho feito críticas a Cristãos que não são Pensadores mas Ideólogos. Esse seu texto Norma, "cheira" a Ideologia. Ainda! Espero apenas que ainda. Para o seu próprio bem e para o bem do próprio Cristianismo, já que estás se tornando líder, a ponto de seus artigos aparecerem em boletins de igrejas, aqui em Niterói. E não sei se és uma pessoa responsável, e falo da responsabilidade de todo Pensador e Intelectual que se autodefine como Cristão. Mas, se se tornares uma Pensadora de verdade e não uma Ideóloga aí serás MUITO BEM VINDA. Pois precisamos disso : de uma verdadeira Pensadora. É, esse artigo, post, ainda um texto ideológico claro e distinto. E Edson Camargo, concordo contigo quando dizes que não precisamos de ideologias, que o Cristianismo não precisa de ideologias. Concordo mesmo! Pegue o texto da Norma Braga e troque certas palavras por outras, como por exemplo, Comunismo por Liberalismo, e verás o que ocorre. Pegue dados aleatóriamente no mundo e forneça para ela e peça que as comente. Veja no que dará! Faça o teste! Mas, ela esta fazendo um estudo sobre ideologia. Vamos ver no que vai dar. Para o bem do Cristianismo, espero que lhe liberte de vícios de/do Pensamento. Aliás, para o rumo que as coisas estão tomando, para o nosso próprio bem!
Caro prof. Emy,
Agradeço-lhe a preocupação e a deferência. De fato, por excesso de trabalho, vivo uma vida praticamente reclusa e estou bastante surpresa por saber que meus textos circulam pelas igrejas de Niterói. Obrigada por me contar isto!
Quanto à ideologia, creio que o senhor se engana quando recorre - com conhecimento de causa ou não - às considerações de Marx com relação ao termo "ideologia" para dizer que comunismo e liberalismo se equivalem. Bom, eu não creio que o liberalismo seja um sistema, mas simplesmente o modo que os homens arranjaram para dispor de seus bens como bem entendem, com base em uma desejável liberdade individual. Se há excessos, eles se devem não à ideologia, mas à própria natureza humana, pecadora. Ou seja, não há no liberalismo um conjunto de idéias totalitárias, que pretendam moldar a realidade através de imposições cruéis. No comunismo, como o senhor certamente sabe, não temos liberdade sobre nossos bens, pois todos os bens importantes são confiscados pelo Estado. Sequer temos liberdade sobre nossos próprios corpos e mentes, pois a ideologia totalitária requer adoração sem restrições. Não preciso lhe fornecer exemplos; o senhor certamente sabe o que aconteceu na antiga URSS e o que acontece até hoje na China, em Cuba, na Coréia do Norte.
Assim, quando falo em "ideologia", não uso a definição de Marx, mas as dos historiadores (e ex-comunistas) Besançon e Furet, que são muito parecidas: ambas reportam ideologia a um sentimento religioso distorcido. Ei-las:
Besançon:
"Doutrina que promete, como resultado de conversão, uma salvação temporal, conforme a uma ordem cósmica decifrada cientificamente em sua evolução, que impõe uma prática política visando à transformação radical da sociedade."
Furet:
"Sistema de explicação do mundo através do qual a ação política dos homens tem um caráter providencial, excluindo toda divindade."
Quando o Estado interfere na realidade e na liberdade individual com o fim de realizar uma utopia na terra - o "outro mundo possível" - , coloca-se no lugar de Deus. Foi o que aconteceu tanto no nazismo quanto no comunismo, que prometiam "salvação": o primeiro, para o povo alemão; o segundo, para o proletário. Ambos faziam bodes expiatórios (judeus, ciganos, gays, no caso nazista; classe dominante, fracos, deficientes e também gays, no caso comunista bolchevique). Ambos mataram milhões, dentro e fora de seus países. É disso que falo quando me refiro a "ideologia": doutrinas que servem para justificar e manter um poder máximo nas mãos de homens, que se arvoram em deuses poderosos e tomam para si decisões injustas, arbitrárias e mortíferas contra outros homens.
Quanto à sua pergunta sobre minha responsabilidade, respondo-lhe muito sinceramente: enquanto houver, disfarçada de cristianismo, ideologia ameaçando e solapando a fé de meus irmãos, eu continuarei a me sentir responsável por falar-lhes do perigo idolátrico que correm ao confundir a salvação de Cristo com a salvação do Estado. Se o senhor acha que isso é "vício do pensamento", creio que precisa compreender o que significa, para um cristão, esperar salvação do governo ou de um sistema político em vez de esperá-la de Deus: idolatria é o termo mais exato que encontro para definir isto. E essa idolatria específica arrasta consigo outros pecados: cobiça, inveja, roubo, assassinato. Disso trato em profusão no blog e não creio precisar repisar tais associações. Apenas lhe peço: se deseja de fato continuar com essa discussão, prefiro que deixe bem claro qual é sua posição política. A definição de Marx para "ideologia" é capciosa porque apenas atribuída unilateralmente: quem denuncia uma ideologia proclama-se isento dela, jogando para cima do outro toda sorte de insinuações de má intenção. Mas não creio ser prudente conversar com quem insiste em se colocar em um local de neutralidade. Se assim for, prefiro não continuar essa discussão, mas saber com quem exatamente estou falando.
Obrigada.
Oi Norma,
vc tem mesmo muita coragem para escrever assim.
Gostaria muito que a partir destas meditações fosse gerado um bom debate saudável...
A dialética não explica tudo mas nos ajuda a avançar em certos pontos.
Abrçs,
Rogério
Olá, Roger,
Por que coragem? Não entendi...
Coragem de fato seria se eu escrevesse assim em Cuba, na China ou na Coréia do Norte. Ou burrice. :-)
Abraços!
Norma, na mosca!
Muito cristão infatilóide fica ajeitando um casamento saudável entre comunismo e cristianismo.
É a igreja dando um tiro no pé e os ideólogos do comunismo morrem de rir!!!!!
Porque o jogo ideológico é esse mesmo: ocupar espaços. Então o pessoal fica lendo os ariovaldos da vida e fica com os olhos remelentos, não enxergam direito! Daí lêem a bíblia com óculos vermelhos.
Você tem toda razão: a ideologização das relações humanas deturpa o sentido das mesmas.
Quando se reage a isso e tenta-se expor as vísceras da armadilha ideológoca, óbviamente dando nome aos bois, ainda se é acusado justamente de ideologizar......
Durma com um barulho desses.
Caro Emy Neto,
Abstive-me de postar sua mensagem para preservar seus dados pessoais.
O senhor se engana sobre mim. Não preciso pesquisar para saber o número infinito de idolatrias que o homem, cujo coração é uma "fábrica de ídolos" (Calvino), pode inventar.
No entanto, convenhamos, uma idolatria totalitária - uso o termo apud Hannah Arendt, que identifica dois totalitarismos: comunismo e nazismo - que resultou em cem milhões de mortos precisa de uma oposição mais ferrenha, ainda mais na medida em que há muita gente no Brasil que se diz cristã E comunista.
Obrigada pelos desejos de boa sorte. Desejo-lhe o mesmo.
Norma,
o esquema disjuntivo que você propõe (alguém o enganou / você é um enganador) não serve a um punhado de gente, cristã e reformada, como eu. Compreendo que você queira ir aos fundamentos, aos princípios, daí a necessidade de explorar termos fundamentais como comunismo – essa respeitável idéia-cadáver depositada em suntuoso mausoléu ou aquela excrescência chinesa (Coréia do Norte e Cuba só confirmam minha figura) - ou marxismo, palavra que você não empregou neste post, mas em outros, sem deixar claro de que “marxismo” está falando, além de ideologia, termo sobre o qual muitíssima coisa tem sido dita, mas parece que você (como de resto todos nós) só selecionou o que lhe foi conveniente.
Mentes acostumadas ao raciocínio acadêmico, como a sua, sabem que há uma distância entre as proposições iniciais de um sistema filosófico (ou político, ou econômico) e seus desdobramentos, tanto teóricos quanto práticos – já posso prever que é daqui que você vai reafirmar sua posição. Acho difícil sustentar essa discussão com base numa camisa de força que maligna tudo que venha de Marx. Se olharmos para a história com um pouco de boa vontade e humildade intelectual, veremos que há outros vilões. Você tem falado (leio seus posts) dos genocídios e do caráter essencialmente anti-cristão do comunismo. Mas há estudiosos que atribuem à religião (e ao cristianismo) outros milhões de assassinatos, e muitos pensadores não alinhados ao materialismo histórico atuaram intelectualmente contra o cristianismo (veja o caso de Bertrand Russel, veja os usos ideológicos da ciência). Além disso, considero que, se sua crítica for levada às últimas conseqüências, deveríamos refugar as consistentes porções de verdade que se encontram nos pensadores influenciados por Marx: para não falar de Foucault, que, a despeito de muitas idéias nefastas, nos favoreceu com o rompimento da “dicotomia rígida” opressor / oprimido, trazendo para mais perto do “indivíduo” os problemas relativos ao poder, o que fazer com Bakhtin (nem seu exílio imposto pelo governo comunista o fez renegar seu “marxismo e filosofia da linguagem”), com a crítica da cultura, de Adorno e Horkheimer, com as proposições incontornáveis da análise do discurso? E o que fazer com Saramago? Desaconselhar sua leitura? E tantas outras expressões culturais “contaminadas” pelo materialismo histórico? Para o bem da coerência, Norma, rejeitemos o pacote inteiro. Você recusa a “dicotomia rígida” do marxismo clássico e põe outra no lugar. E antes que você pergunte, saiba que meu posicionamento político é: o materialismo histórico é capaz de fornecer uma explicação e uma crítica consistente ao capitalismo e suas mazelas. Por causa dele é possível pensar em formas reguladas de exploração / produção de riqueza, em políticas públicas que tragam equilíbrio social. Com democracia. Não é só o indivíduo que comete pecados, um sistema também pode ser pecaminoso, o comunismo é pecaminoso, conquanto você negue o seu equivalente ao capitalismo. Penso que essas idéias que você defende não são problemáticas pela análise em si, que tem seu tanto de verdade, mas por causa do seu correlato: estabelecer uma relação inevitável entre cristianismo e a face econômica do Estado Liberal. Você pode criticar o quanto quiser os rumos do atual governo e as idéias dos comunistas, socialistas e quem mais você queira – pelo menos para isso serve nossa frágil democracia – mas demonizar (alguém o enganou / você é um enganador) quem pensa política diferente de você é uma temeridade.
Desculpe a prolixidade, fique à vontade para não publicar.
Com respeito e admiração,
Raquel Nery
Cara Raquel,
Não acho que o que você chama de "esquema disjuntivo" seja demonização. Senão, teríamos de acusar o próprio Jesus de demonização com relação a boa parte de suas afirmativas.
Não creio que haja problema em dizer que o cristão comunista não compreende o que é comunismo, ou então compreende e está de má-fé. Há muitos bons sentimentos sufocando o real sentido do comunismo: máxima concentração de poder no Estado-Partido. E as figuras públicas que você citou só contribuem para aumentar a confusão - isso, para falar talvez do mal menor que causam. (Foucault, por exemplo, fez parte do movimento francês pela redução da idade de consentimento para o sexo - algo como um prenúncio de NAMBLA, associação americana abertamente pedófila.)
Quanto a associar o liberalismo ao cristianismo, não costumo fazer isso no blog. No entanto, reconheço que a liberdade pessoal tem sua origem no cristianismo, e a liberdade pessoal é um dado importante, fundamental, no liberalismo - enquanto no comunismo, não. Porém, jamais cairia no extremo oposto de louvar a "face econômica do Estado liberal" como o único modo genuinamente cristão de organização política. Isso seria idolatria. Creio que, se você viu isso em meus textos, trata-se unicamente de uma associação sua. É algo que costumam fazer nos comentários: ilações do tipo "se você ataca a esquerda, é portanto uma defensora do capitalismo selvagem" - com todos os atributos pesados que, explícitos ou não, acompanham essa espécie de acusação.
Mas eu não me incluo nisso. O que faço é procurar desvelar ao público cristão a força anticristã do esquerdismo, que me atingiu em cheio durante meus anos de faculdade. Veja, se não me engano, você também passou muitos anos na faculdade, como eu. Como deixar de perceber a onipresente difamação do cristianismo via discursos de esquerda? A esquerda está sempre ligada às piores causas do planeta: aborto, criminalização da homofobia, feminismo hostil, ação afirmativa, descriminalização das drogas, desagregação e desvalorização da família, chacota da religião, relativismos de linguagem, culpabilização da razão e da lógica... Eu me pergunto como você deixou de perceber isso nesses anos todos. O esquerdismo é um poderoso fator desagregador, como precisa ser qualquer movimento anticristão. Quando une, une pessoas sempre escorado no bode expiatório: contra outras.
Quanto ao fato de o capitalismo ser um "sistema pecaminoso", creio já ter dito isso no blog: não acredito que o capitalismo seja um sistema, mas sim o modo como homens livres se organizam naturalmente para negociar. "Sistema" é o comunismo, cheio de fechamentos autoritários. Foi Marx quem cunhou a palavra "capitalismo" para que servisse como bode expiatório do comunismo. A estratégia tem dado certo até hoje.
Todos os problemas do "capitalismo" se devem a uma única fonte: o coração ganancioso e idólatra do homem. Já os principais problemas do comunismo, sim, decorrem do fato de que ele é um verdadeiro sistema fechado e autoritário, que superdimensiona o pecado humano e a sede de poder que o caracteriza.
De resto, o que escrevo no blog trata de tudo o mais. Há muita leitura e muita reflexão por trás de cada ponto que levanto aqui, facilmente encontráveis nos arquivos.
Espero que, com esta mensagem, você tenha compreendido melhor minha posição.
Abraços sinceros.
Ah, Raquel,
Seria bom dar uma olhada nesse artigo do historiador Carlos Azambuja sobre o marxismo.
Abraços!
As contradições do marxismo
Carlos I. S. Azambuja
As ações dos partidos comunistas que se apoderaram do poder são coerentes com as teorias de Marx? Essa é uma pergunta que exige reflexão, embora a teoria marxista seja contraditória: diz que na sociedade capitalista quando as forças produtivas tiverem alcançado o pleno desenvolvimento, produzir-se-á um choque violento de classes que conduzirá à revolução socialista. É necessário que o capitalismo se desenvolva plenamente, pois o socialismo exige a industrialização plena e uma forte classe proletária, capaz de desempenhar o papel de redentora das massas.
Por outro lado, porém, já em 1848, antes portanto do capitalismo se desenvolver, Marx e Engels convocaram, no Manifesto do Partido Comunista, a união dos proletários de todos os países para fazerem a revolução – “proletários de todos os países, uni-vos”.
Enquanto a teoria previa o advento do socialismo somente após o natural desenvolvimento das forças produtivas na sociedade capitalista, a prática concitava à unidade dos proletários de todo o mundo para a revolução socialista, abstraindo o estado em que se encontravam as forças produtivas na Europa de então.
Para apoderar-se do poder político, diz a teoria, é necessário que um grupo de revolucionários profissionais organize um partido – que necessariamente receberá a denominação de comunista – e que, sob o centralismo democrático, assumirá o papel de vanguarda do proletariado.
Segundo Marx, “a transformação das relações sociais” não surge de “mudanças tecnológicas”, mas da “luta de classes”. “Na base dessas relações modificadas desenvolve-se um modo de produção especificamente diferente, que cria novas forças produtivas materiais”.
Portanto, o que muda primeiro, como resultado da luta de classes, não são as forças produtivas ou os instrumentos de produção, e sim a mentalidade das pessoas, as relações sociais.
Lênin em seu relatório apresentado ao X Congresso do partido (8 a 16 de março de 1921) sublinhou, por sua vez, que “o que é decisivo é a transformação da mentalidade e dos hábitos”.
Cerca de 8 anos depois, Stalin em um discurso abordando as questões da política operária na URSS, em 17 de dezembro de 1929, no momento em que era iniciada a política de coletivização em massa no campo, declarou que “será necessário trabalhar muito para refazer o camponês-kolkoziano, para corrigir sua mentalidade individualista e fazer dele um verdadeiro trabalhador da sociedade socialista. E chegaremos mais rápido a isso na medida em que os kolkozes sejam providos de máquinas e tratores...”
É evidente a contradição de Stalin com os escritos de Marx e Lênin, ao considerar que a passagem à coletivização não será resultante da “luta de classes” ou da “transformação das relações sociais”, e sim do “emprego de máquinas e tratores” como forma de corrigir a “mentalidade individualista” dos camponeses.
Assim, de acordo com a concepção stalinista, não são os camponeses que se transformam graças à luta de classes, mas são transformados pelas máquinas e tratores.
Antes de assumir o poder, o partido é um ferrenho defensor das reivindicações das amplas massas. Depois de assumir o poder impõe, em nome do proletariado, a ditadura sobre o proletariado.
Se o país possui uma frágil economia, diz-se que é oprimido pelo imperialismo. Assim, os comunistas forjam a aliança da revolução proletária com movimentos de libertação nacional. Isto é, promovem o comunismo à custa do nacionalismo.
Nenhuma pessoa sensata é capaz de opor-se à independência nacional de seu país. Os comunistas, porém, ao se engajarem nessa causa nobre, nada mais fazem do que cumprir a primeira etapa da sua revolução. Tão logo assumem o poder político, hipotecam a independência nacional à União Soviética e ao Movimento Comunista Internacional. Quanto aos nacionalistas sinceros dos movimentos de libertação, basta conhecer um pouco de História para verificar quais têm sido seus destinos, tão logo vitoriosas as revoluções bolcheviques.
O PC utiliza o proletariado como força principal da sua revolução e busca atingir seus fins revolucionários fomentando, em favor do partido, a luta de classes entre o proletariado e a burguesia. Depois essa luta é ampliada, incluindo não apenas o proletariado, mas todos os trabalhadores, e logo a seguir, todo o povo, formando uma ampla frente.
Essa luta entre comunistas e não-comunistas é por eles denominada de luta de classes, conceito que é estendido indefinidamente.
Portanto, não importa se no país-alvo existem ou não uma classe trabalhadora e uma classe capitalista e em que nível se encontram as forças produtivas. Conquanto exista a vanguarda do proletariado - o partido – os comunistas continuarão enterrando os capitalistas em países onde não há capitalismo e a fazer a revolução proletária onde não exista uma classe operária, como na Rússia de 1917.
O Estado, segundo Marx, na ditadura do proletariado se iria enfraquecendo, até desaparecer no comunismo. No entanto, a Resolução Política aprovada na XVI Conferência do PCUS, posteriormente ratificada pelo XVI Congresso (1930), apela para a construção do socialismo, a concentração das forças do partido, da classe operária e, também, à concentração das forças do Estado. Assim, toma força a tese da “revolução pelo alto”, expressão que Marx utilizou para descrever a política de Napoleão Bonaparte, executor da revolução de 1789, na França.
A propósito da “revolução pelo alto”, consta na História do PCUS, aprovada pelo Comitê Central, que a coletivização forçada, iniciada em 1929, “tinha de original o fato de ter sido realizada pelo alto, sob a iniciativa do poder do Estado” .
Segundo Marx, após a revolução a burguesia seria expropriada e não haveria distinção entre trabalhadores intelectuais e operários.
No entanto, logo em 1920, Lênin estabeleceu a “não-limitação de salários dos técnicos e especialistas”, a existência de um diretor único nomeado pelos aparelhos centrais, que seria o único responsável pela direção da empresa, bem como a “autonomia financeira”, que permitiria à empresa dispor de uma parte de seus lucros.
Desenvolveu-se assim, menos de três anos da revolução bolchevique, uma nova burguesia, a Nomenklatura, nas empresas do Estado e do partido. Essa burguesia é de um novo tipo, pois embora não disponha da propriedade jurídica privada, nada a impede de dispor, de fato, dos meios de produção.
Para apoderar-se do poder político, os comunistas, historicamente, participam primeiro de um governo de coalizão e, como integrantes desse governo o paralisam e forjam contradições insanáveis, até assumirem o poder total. O novo regime passará a culpar, então, o imperialismo pela sua incompetência, e a retribuir, com apoio material e político, o auxílio recebido de organizações revolucionárias e mesmo de governos de países vizinhos, como ocorreu, por exemplo, na década de 80 com o regime sandinista, na Nicarágua.
Sob o manto do internacionalismo proletário a União Soviética sufocou as revoltas populares na Hungria, Polônia, RDA e Checoslováquia. Depois, fez o mesmo no Afeganistão. A China invadiu o Vietnam, e o Vietnam, por sua vez, anexou o Laos...
O social-imperialismo, o expansionismo armado, a subversão, a agressão e a anexação sempre foram palavras de ordem estratégicas do bloco comunista, que apesar de repudiado pela sua população, nas ruas, não desistiu de pintar de vermelho o mapa-mundi.
O marxismo sempre afirmou que a maior contradição de nossa época é a que existe entre o socialismo e o imperialismo e não se cansa de proclamar a força do campo socialista, da classe trabalhadora e do nacionalismo, afirmando que essas são as três grandes forças revolucionárias: o movimento comunista internacional, o movimento operário nos países capitalistas desenvolvidos e os movimentos populares de libertação nos países coloniais.
A estratégia comunista de promoção da revolução mundial é conhecida, mas recordá-la não faz mal a ninguém: consiste em criar um ambiente internacional favorável aos comunistas e aumentar o seu poderio econômico e militar para apoiar e sustentar mais eficientemente os movimentos revolucionários em todo o mundo.
Finalmente, o que hoje se observa é que o marxismo que, segundo seu criador, constituiria a sociedade sem classes, serviu apenas para criar uma forma moderna de totalitarismo com base em uma doutrina contraditória, incoerente e ilusionista, mas que, apesar disso, faz da omissão e da ausência de conhecimentos históricos e doutrinários dos não-comunistas o seu principal fator de força.
Norberto Bobbio, marxista italiano escreveu em seu livro Qual Socialismo?, editora Paz e Terra, 1983, que “o problema da conquista do poder pelo movimento operário seja a condição preliminar para a destruição da sociedade capitalista e para a instauração de uma sociedade diferente, fundada sobre a coletivização dos meios de produção, pode ser considerado ponto pacífico.
O que não é, de forma alguma, pacífico, depois do que ocorreu na União Soviética e nos países onde o socialismo foi importado do exterior, é que o problema da conquista do poder passe a ser isolado completamente do problema do seu exercício ou, em outras palavras, pelo modo pelo qual o poder é conquistado nada tenha a ver com o modo como será, em seguida, exercido.
Transferir para depois da conquista do poder o problema do Estado, da organização estatal, produziu o seguinte efeito: o partido, para o qual se voltaram todas as atenções como órgão de tomada do poder, terminou por tornar-se, ele mesmo, o Estado”.
www.midiasemmascara.org
Norma, você disse:
"O que faço é procurar desvelar ao público cristão a força anticristã do esquerdismo, que me atingiu em cheio durante meus anos de faculdade..."
Não é só na faculdade. Nos meus anos de escola pública, antigos "ginásio" e "colegial" (não sei mais como chamam hoje), isso já existe.
Aliás, considerando que fiz uma faculdade de Computação (algo mais matemático que filosófico), posso dizer com certeza que vi isso mesmo mais no ginásio/colegial/cursinho.
É verdade, Cristiano! Mas é que só me converti na faculdade. Não tive condições de perceber essas coisas antes.
Quanto aos escandalizados com minhas palavras sobre enganador/enganado: pensem que esse texto é como um grito desesperado aos cristãos verdadeiros que porventura "estão" comunistas. Algo como um grito de mãe - "Sai daí!!!" - quando vê a criança à beira do abismo.
Bem Norma,
aqui vai um comentário enorme, pois não posso deixar de responder às suas colocações. Mas antes é necessário fazer um acordo, digamos assim. Não é possível desenvolver uma discussão se você nega que haja uma relação entre comunismo e capitalismo, afirmando o primeiro e negando o segundo. De modo que, se houver de sua parte a disposição de compreender (e não apenas ser compreendida), proponho que alguma coisa seja colocada nesse lugar do capitalismo que você, engenhosamente, deslocou. Você diz que o capitalismo não é um “sistema”, e não quero começar aqui a discutir o que um “sistema” venha a ser, mesmo achando que essa afirmação carece de fundamento. Proponho que se estabeleça, no entanto, uma relação: se o comunismo está em um pólo, ponhamos, por exemplo, o não-sistema capitalista, do outro, ou aquilo contra o que as esquerdas se manifestam e atuam politicamente em diversas esferas (partidárias ou não).
O ponto seguinte é dizer que a palavra comunismo é um tanto inadequada para um debate que tenha o Brasil por referência. Que sentido há, na realidade brasileira, alguém dizer (Niemeyer, por exemplo) “sou comunista”? O que isso significa? No máximo, “um ateísmo exemplar”. O comunismo como adversário real (possibilidade de revolução, confisco da propriedade privada, estabelecimento de um estado-partido, etc., etc...) parece-me um anacronismo, ou é verdade que uma conspiração se avizinha? Por isso proponho que coloquemos, de um lado marxismo e/ou esquerda, de outro, neoliberalismo e / ou direita.
Isto posto, vamos às suas colocações:
“Não acho que o que você chama de "esquema disjuntivo" seja demonização. Senão, teríamos de acusar o próprio Jesus de demonização com relação a boa parte de suas afirmativas.”
A demonização não está na disjunção, na verdade independe dela. O que disse foi: de acordo com sua análise, aquele que adere politicamente à esquerda está inexoravelmente associado ao mal. Não sei de que afirmativas de Jesus você fala. Para entender o que você propõe precisaria analisar as suas e as de Jesus.
“Não creio que haja problema em dizer que o cristão comunista não compreende o que é comunismo, ou então compreende e está de má-fé. Há muitos bons sentimentos sufocando o real sentido do comunismo: máxima concentração de poder no Estado-Partido.”
Não, Norma, a questão não é só essa – sentimentos altruístas que justificariam de alguma forma a adesão à malignidade inerente à escolha de alguns postulados. Sugiro que pense na alternativa de um cristão ser de esquerda por convicção, por entender que nela há uma possibilidade mais concreta de minimizar alguns dos efeitos do “não-sistema” capitalista, por lançar mão (mesmo que parcialmente) de um aparelho crítico que olha os fatos da realidade e os compreende como parte de uma totalidade perversa e ímpia, produtora de mazelas (sociais e morais) tão inaceitáveis como as que o comunismo produziu. E aí chego no ponto fraco de seu argumento: “Todos os problemas do "capitalismo" se devem a uma única fonte: o coração ganancioso e idólatra do homem. Já os principais problemas do comunismo, sim, decorrem do fato de que ele é um verdadeiro sistema fechado e autoritário, que superdimensiona o pecado humano e a sede de poder que o caracteriza”. Ora, estou me perguntando em que medida o “não-sistema” é aceitável em relação ao “sistema fechado e autoritário”, se o critério de avaliação de ambos, pelo que entendi, é tanto sua origem (o coração do homem) quanto o efeito que produzem (mazelas sociais e morais). E aqui tenho um ponto a meu favor: não preciso defender o comunismo: primeiro, na realidade brasileira ele não existe, nem como ameaça (já vai longe o segundo mandato de Lula, a ameaça vermelha mais concreta que o Brasil experimentou); segundo, a história recente já julgou os sistemas totalitários, todos, o nazi-fascismo, o comunismo, (se quiser pode juntar este àquele, pra mim não faz diferença), as ditaduras sul-americanas (assunto sobre o qual nunca li nenhum post seu), de forma que não me ocupo de defender o que não precisa de minha defesa.
“E as figuras públicas que você citou só contribuem para aumentar a confusão - isso, para falar talvez do mal menor que causam. (Foucault, por exemplo, fez parte do movimento francês pela redução da idade de consentimento para o sexo - algo como um prenúncio de NAMBLA, associação americana abertamente pedófila).”
Esse ponto é importante. Não é só você que não gosta de Foucault. O marxista ortodoxo tende a rejeitá-lo, pela razão que coloquei no meu comentário anterior. O historiador tradicional também o rejeita. Ele é um iconoclasta bastante desagradável. Mas não posso considerar viável uma discussão que, debatendo idéias, desqualifique seu autor para enfraquecê-las. Essa estratégia, que não considero muito elegante, é bem comum no jogo político em período eleitoral. Não é esse o nosso caso. Deixemos Foucault de lado, com a ressalva de que sua potencial pedofilia faz pouca diferença no momento em que proponho a validade do que ele escreveu em “as palavras e as coisas”, por exemplo. Estou curiosa por saber do mal (o maior e o menor) que causaram Adorno, Bakhtin e Pêcheux. Sei, no entanto, que os quatro escreveram coisas importantes para entender o mundo contemporâneo, coisas que não posso simplesmente desconsiderar porque sou crente, ou porque a maioria dos marxistas é atéia. Minha tradição reformada ensinou-me que toda verdade é verdade de Deus.
“Como deixar de perceber a onipresente difamação do cristianismo via discursos de esquerda? A esquerda está sempre ligada às piores causas do planeta: aborto, criminalização da homofobia, feminismo hostil, ação afirmativa, descriminalização das drogas, desagregação e desvalorização da família, chacota da religião, relativismos de linguagem, culpabilização da razão e da lógica...”
Bem, Norma, respondo a essas observações lembrando-a de duas coisas: primeiro, que há males no mundo que você não enumerou. Você refere aos itens de sua lista como os piores, um marxista fará outra lista, e dirá que aqueles é que são os piores. Minha tentativa, como cidadã crente, é romper com esse esquematismo que implica uma espécie de cegueira voluntária (só vejo o que interessa às minhas convicções) e digo que uns e outros são maus, profundamente maus(exceto o feminismo e as ações afirmativas). Segundo, a difamação do cristianismo não tem sua origem na esquerda, embora nele tenha assumido uma forma bastante particular, e nisso você está correta. Mas acho que você força a barra quando diz que desagregação e desvalorização da família, chacota da religião, relativismos de linguagem são causas marxistas; a idéia de que a esquerda é o inimigo prototípico do cristão já não se sustenta. Na minha opinião, esse papel foi assumido pelos usos ideológicos da ciência – e você não conseguirá vincular essa ação ao marxismo. Proponho, inclusive, que você reflita sobre a possibilidade de que a crítica da racionalidade (um ponto importante do pós-estruturalismo) seja um antídoto para essa atmosfera anti-religiosa (e anti-cristã) que nos ameaça. Os males que você enumerou compõem, sim, a agenda de uma parte da esquerda, mas não é do marxismo que essas causas retiram sua força, mas da mentalidade científica que impregnou nosso tempo e transformou a religião em nonsense.
“Eu me pergunto como você deixou de perceber isso nesses anos todos. O esquerdismo é um poderoso fator desagregador, como precisa ser qualquer movimento anticristão.”
Minha experiência na universidade (parece que a sua foi muito difícil...) me trouxe outras percepções. Percebi, por exemplo, que todas as teorias que me foram apresentadas negavam a Verdade. Isso foi o que me impactou mais: o consenso da impossibilidade da Verdade, uma característica da modernidade, na qual o marxismo está contido. Fiquei um tempo comparando a teoria do signo lingüístico (principalmente por causa da noção da arbitrariedade da relação significado / significante) com João 1:1 (“o Verbo era Deus”). Nenhuma teoria literária foi condescendente com minhas convicções bíblicas (e já adianto: no meu tempo de UFMG, os estudos culturais disputavam, a custo, um espaço relevante na pesquisa literária, não eram predominantes como o são hoje na UFBA, por exemplo). Na iniciação científica tive de lidar com teoria literária de base psicanalista. As coisas não foram, portanto, como você experimentou. O mal estava no marxismo tanto quanto na psicanálise, nos estudos de literatura clássica, nos fundamentos epistemológicos de tudo o mais que estudei. Mas, a despeito de tudo isso, saí da universidade sendo uma cidadã mais consciente, mais crítica, menos ingênua, com mais autonomia para refletir, pensar, avaliar o mundo. A fé, pela graça de Deus, permaneceu (por causa da perseverança dos santos...), e a Palavra sempre foi o crivo a partir do qual pude julgar tudo e reter o que fosse bom.
Acho que essa hierarquia que você construiu, colocando o marxismo como o pior dos males, pode ser fruto de sua experiência pessoal ou, talvez, uma tentativa de “cristianizar” suas convicções políticas liberais. No fundo, a discussão, que não encerra aqui, recai no conceito de Estado, nos papéis que esperamos que ele exerça ou não. E sobre as ilações, bem, todo mundo as faz. A sua foi achar que me escandalizei com suas convicções. Bem, a essa altura da minha caminhada cristã (nasci em lar cristão e presbiteriano) preciso adverti-la de que é necessário um pouco mais do que isso pra me escandalizar, e, por outro lado, desejo que nenhuma de minhas palavras escandalize algum de seus muitos leitores.
Raquel
Olá, Raquel,
Olha, li o seu comentário e agradeço suas preocupações, mas acho que esse diálogo funcionaria melhor pessoalmente. Há uma "parede" entre nós difícil de ser removida. Creio ter sido mal compreendida por você na maioria dos pontos que levantou. Em alguns deles, você me acusa injustamente de desonestidade argumentativa. Acredito que isso se deve principalmente ao seu desconhecimento dos fatos que aponto em outros lugares para sustentar o que defendo. Falta-lhe, na verdade, leitura conservadora (que não equivale a leitura liberal, e aqui sequer falo da economia propriamente dita, assunto que conheço muito pouco) para compreender minha posição.
Desculpe dizer isso tão claramente, mas também lhe falta conversar comigo como quem conversa com uma irmã. Seu tom é professoral, acadêmico demais, e suas palavras são de desconfiança. Calma. Afinal, isso aqui é um blog, não uma defesa de tese. ;-) Se eu fosse usar do rigor acadêmico para escrever um post que fosse, eles seriam enormes e improdutivos. Aqui, meu tom é direto e a necessária brevidade dos textos esconde muita leitura, muita definição. Como o recente post dos dois bodes, por exemplo. Eu teria de fazer um livro para defender apropriadamente aquilo ali.
Como não quero continuar a debater por aqui, só uma palavrinha com relação a Foucault. A defesa do sexo com menores está intimamente relacionada a seu pensamento, já que as questões da liberdade sexual estão centrais ali. Da mesma forma, Sartre defendeu o horror leninista, com assassinatos e tudo. Ora, ciente disso, posso fazer como o avestruz que enfia a cabeça na terra e continuar lendo seletivamente; ou, posso tentar integrar esse dado no conjunto de toda a sua obra. Posso lhe dizer que, particularmente, faço as duas coisas, mas a academia só faz e ensina a fazer a primeira. Essa leitura seletiva chegou a tal ponto que uma vez, na Letras, lemos em sala um texto de Walter Benjamin que terminava com uma estrondosamente clara defesa do comunismo. E isso não foi mencionado nem uma vez, pois ali estávamos analisando o "Benjamin literário". Porém, o comunismo era a conclusão de tudo. Precisava pelo menos de uma mençãozinha. Afinal, os autores são pessoas antes de tudo e merecem ser vistos assim.
Obrigada pela atenção que você dedicou ao meu blog. E desculpe o tom mais pessoal - pode ter certeza de que isto não é "estratégia argumentativa". ;-)
Abraços!
Ol� Norma, agrade�o sua gentileza em rela�o aos coment�rios acerca daquela antiga postagem que enviei ao seu blog.
Fiz uma cr�tica a seu texto, pois o li e pensei acerca de sua argumenta�o de modo pormenorizado.
Continuo admirando sua intelig�ncia aguda, mas tamb�m continuo a discordar de alguns pontos-de-vista que voc� exterioriza.
Um abra�o, sempre em Cristo,
Maya
Norma,
É verdade que um blog não é um espaço acadêmico, é verdade também que seria mais produtivo conversar pessoalmente. A questão é que você não apenas declarou o que pensa, mas atacou.
Quanto ao tom "professoral", bem, admito que a atmosfera ficou um pouco nublada, e, provocada, apostei no seu esforço de "recolocar o cristianismo na via dos debates intelectuais". Não julguei que estivesse sendo inadequada. Obrigada por permanecer cooperativa.
Ah, tenho certeza de que vc estuda muito;-)
Raquel
Ô, Raquel, estudo muito menos do que gostaria... Você sabe o quanto a área de Letras pode ser ingrata quanto a remuneração. Trabalho demais (aulas, revisão, tradução) e me sobra pouco tempo para estudo. Estando, agora, com um "pé" na teologia, sinto-me uma total iniciante... mas essa sensação é boa. ;-)
Quanto ao mencionado "ataque", o que acontece é o seguinte: quando, em uma instituição, você percebe todo um ritual de idolatria de algumas figuras (e execração de outras), às vezes sente a necessidade de fazer um esforço violento na outra direção para que a figura, pesada de adoração, seja deslocada do pedestal. Apenas isso.
Se você quiser continuar debatendo esses assuntos, pode escrever para meu e-mail. Será bem-vinda!
Abraços!
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