Não entendo que muitos que se denominam "cristãos" hoje consigam
tranquilamente negar a base de toda a nossa fé: a unidade da Bíblia.
Em primeiro lugar, eles demonstram com isso uma tremenda falta de
confiança nos irmãos que tanto trabalharam, antes deles, durante
séculos, nas mais variadas áreas, para reconhecer e confirmar a
autenticidade de todos os 66 livros das Escrituras. Exibem-se assim não
só como pretensos "descobridores da pólvora" - e Deus sabe o quanto a
tentação do ineditismo, em nossos dias, é avassaladora - , mas sobretudo
como desdenhosos (e, não duvido, ignorantes) de todo o generoso
encaminhamento investigativo que Deus permitiu para que tivéssemos esse
impressionante Livro, coeso, em nossas mãos.
Em segundo lugar, fazem com a Bíblia algo que jamais fariam com seu
autor literário predileto: ignoram pedaços inteiros como "corpos
estranhos" para dar coerência a uma ideia previamente estabelecida por
eles, imputando-a ao todo como uma camisa-de-força. Agem assim como
verdadeiros Jacks Estripadores do livro que sustenta todo o
cristianismo. Fico imaginando um crítico literário que, diante de um
romance de Albert Camus como A peste, tentasse provar intenções espúrias
do personagem principal, doutor Rieux, argumentando que todas as páginas que descrevem
seus esforços contra a praga "não foram, na verdade, escritas por Camus e
não pertencem ao livro". Será que daríamos tanta atenção a esse crítico
quanto damos aos teólogos universalistas, por exemplo - que, contra
toda palavra do próprio Cristo sobre o inferno, preferem "pular" os
trechos que os tiram de sua zona de conforto ou, pior, preferem
interpretá-los esotericamente? Por que levaríamos as Escrituras menos a
sério, em sua inteireza, do que consideramos uma obra de literatura?
Posso entender essa leitura afrouxada por parte de um descrente, mas não
de um crente em Cristo, sobretudo quando pensamos o quanto Cristo
conhecia, estudava e amava a Palavra que tinha em suas mãos: o Antigo
Testamento.
Diante de qualquer texto, requer-se do leitor que não projete seus
próprios anseios e preconceitos por sobre a leitura. Caso proceda assim,
será um mau leitor e não conseguirá formar uma ideia adequada do que
está lendo, seja uma narração, uma descrição ou uma peça argumentativa. A
Bíblia precisa de leitores que a abordem, no mínimo, como a um texto
coerente, não um amontoado de frases ou livros sem conexão entre si.
Mas, sobretudo, precisa de leitores que se aproximem dela como se
aproximariam do próprio Cristo: com "ouvidos para ouvir", ou seja,
humildade para aprender e coração fértil para as mudanças que Deus quer
operar em nós, para a Sua glória. Só para esse leitor humilde a Bíblia
será, como foi para Timóteo, "as sagradas letras, que podem tornar-te
sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus" (2Tm 3.15).
Saiba mais: Augustus Nicodemus trata da autoridade das Escrituras; A Palavra, não a tradição.
5 comentários:
Hum... É... Mas são 73 livros. Você fez com os outros 6 o que acusa os outros de estarem fazendo?
Quer dizer... outros 7?
Eu? Você não conhece a história? Os textos não estavam lá; na Bíblia usada por Jesus e por todos os judeus seus contemporâneos, o AT é como está na Bíblia protestante, não na católica. Ou seja: os 7 livros não pertenciam ao cânon hebraico do Antigo Testamento. Além disso, ferem o próprio princípio de coesão e unidade ao apresentarem ensinamentos contrários ao restante das Escrituras.
Esta negação da unidade bíblica, quando é feita pelos "de fora" é esperado, mas muito triste quando se vê com os supostos que se dizem "de dentro". Conforme um autor que aprecio já declarou, se tem um povo que deveria ser reconhecido como o "povo do livro", este grupo deveria ser os cristãos. Se antes o pecado do povo de Israel era o de seguir as imagens que faziam para si, ao invés da Lei, hoje também de certo forma temos isso: deixamo-nos influenciar mais pelas "imagens" oferecidas pelo mundo moderno do que pelas letras da Palavra, colocando nelas o valor de "verdade" ao invés de fazer isso com as Escrituras; muitos cristãos tem cometido este erro.
Saindo um pouco do assunto, mas talvez nem tanto, sou leitor da Bíblia já há vários anos (minha velha compañera), e o meu approach simplesmente é o seguinte: leia o texto com honestidade suficiente para dizer "não entendi nada" ou "por que está escrito isso", pois vejo isto como momentos positivos que nos motivam a buscar o entedimento correto das coisas. Além disso, como diz o pastor da minha igreja, e meu professor de EBD: "aprendar a ler o quê está escrito, e saiba ler o que está se lendo". Muitos não seguem estes conselhos e acabam concluindo coisas super erradas, incluindo o de que a Bíblia não é a Palavra de Deus.
Norma,
ouvi dizer que os textos atribuídos a Sócrates, por exemplo, são de origem muito duvidosa. Só que nessas horas ninguém quer saber da ciência que tanto idolatram. Estranho, não?
No entanto, quando se trata da Bíblia a atitude é totalmente outra. E não apenas por parte de quem está fora, como você apontou.
Sobre o seu segundo parágrafo, os emergentes é quem adoram fazer isso nos dias de hoje.
Muito bom o post.
Abraços!
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