08 dezembro 2011

Maquiagem e teologia

Ainda não estou com o braço cem por cento, mas já me arrisco a escrever um pouquinho, aqui e ali. Uma amiga virtual, Renata, tem um excelente blog sobre maquiagem, do qual sou leitora assídua, chamado Conversa de beleza. No post de hoje, ela propôs que as leitoras escrevessem livremente suas opiniões sobre a seguinte citação, que ela retirou de um programa de tv e traduziu:

Mary (narração): Sempre me espantei com os objetivos da maquiagem: anti-sinais, firmadora, regeneradora, micro-escultora; pagar um absurdo em garrafinhas de 100mL. Fico estupefata. Honestamente, parece um safári. Quero dizer, até entendo. Em um nível, você quer mudar, se esconder, sentir-se como qualquer outro que não você – nem que seja por uma noite. Mas no final do dia, é o que seu reflexo exaurido lhe dirá todas as vezes, a maquiagem sai e tudo o que lhe resta é exatamente quem você é.

Eis meu comentário, que partilho com vocês:

Querida Renata,

Eu não resisto a filosofar e teologizar aqui um pouquinho, comunicando uma cosmovisão que está enraizada na minha escolha religiosa: o cristianismo bíblico. Eu não deixo a religião no “armário” das opiniões pessoais e subjetivas, sabe; para mim, a cosmovisão cristã é minha verdade. E fico feliz por você ter pedido a opinião das leitoras. :-)

Então, quando leio uma declaração dessas, a primeira coisa em que penso é: “Mas quem somos exatamente?” Acredito no pecado original, ou seja, acredito que os homens se separaram de Deus por escolha própria. Isso significa que nada no mundo é “normal”, nada é o que deveria ser. Assim, não somos perfeitos, ninguém é perfeito, e a perfeição só será alcançada no céu. Então, “ser o que você é” é “ser pecador”, com todos os efeitos do pecado, efeitos que não são somente morais, mas também têm a ver com a mortalidade – ou seja, com o fato de que nossos corpos são vulneráveis e tendem à destruição. Nesse contexto, “ser o que sou” não deve ser um lema, uma bandeira (a não ser que signifique “ser espontâneo e autêntico”, no sentido da sinceridade), porque meu “ser natural” inclui todas as minhas imperfeições, e todo mundo quer se aperfeiçoar, ser melhor do que é. No âmbito moral, não há “maquiagem” que resolva: nossos “podres” precisam ser identificados, perdoados e depositados aos pés da cruz de Cristo; no âmbito estético, a maquiagem é muito bem-vinda e devemos lançar mão dela incondicionalmente. Mas, mesmo no âmbito estético, em Cristo nós temos a promessa de um céu onde, certamente, ninguém precisará de maquiagem. ;-)

A segunda coisa em que penso é menos teológica e mais estética mesmo. De novo, pergunto: “Mas quem somos exatamente?” Tudo modifica nossa aparência: a luz, as cores do ambiente, o clima, as emoções, os adornos, as roupas que vestimos. Ninguém tem controle total sobre a própria aparência, seria impossível. Mas temos algum controle, e é justamente isso que a maquiagem, os cosméticos e a moda nos possibilitam: usar a luz, as cores, as texturas, os formatos, os adereços a nosso favor. A autora da citação, para ser coerente, teria que andar pelada e deixar de usar até desodorante. O que ela afirma contradiz a própria civilização.

Para resumir, o texto dela é uma amostra da filosofia do “bom selvagem” aplicada ao mundo do make up. Não posso concordar com o naturalismo que ela advoga. E também é uma confusão entre esferas: ela está expressando uma preocupação existencial através de algo que é estético. Isso é exigir demais da maquiagem ou da não-maquiagem. No final do dia, quando olho no espelho, o que resta é simplesmente uma Norma com o rosto lavado! :-D

Grande beijo e obrigada por pedir respostas espontâneas!

9 comentários:

l disse...

Já viſte Que las mujeres aprendan en silencio, de Angelit Guzmán de Mesa, publicado em linha já há muitos anos pela ABU, quando ela era mais conservadora?

Wilson Porte Jr. disse...

Parabéns, Norma! Excelente resposta...

bee disse...

as always! ;-)

Casal 20 disse...

Norma, saudade de suas exposições cristãs sobre a cultura. Gostei muito da sua resposta.

Abraços sempre afetuosos.

Fábio.

Davi Carvalho disse...

Olá Norma,
sou de BH.
Fiquei maravilhado com a resposta que destes. Você lançou luz sobre o pensamento da maioria das pessoas. Todos são razos e não mantém conexão de correção. Uma pergunta: Essa vontade de voltar (não sei pra onde) e que para onde estamos indo é terrível, também seria um resquicio da revelação geral?

Davi
(Enviei para minha esposa, ela não é cristã. Quero ver o que ela vai dizer)

Mulher na Polícia disse...

Oi!

Lembrei-me de ti!
: )

http://sylviodealencar.blogspot.com/2011/12/amizade-tem-dessas-coisas.html

Bom Natal procê.
Bjos!

Norma disse...

Pessoal,

Estou evitando escrever por causa da tendinite, mas obrigada pelos comentários!

Anônimo disse...

Oi Norma!

Eu acho essa questão muito mais complexa do que a auto-imagem, capricho ou vaidade.
Em primeiro lugar, a GRANDE MAIORIA dos cosméticos possuem elementos químicos altamente nocivos à saúde,existem pesquisas sérias mostrando como ingredientes comumente utilizados podem causar desde dermatites, problemas endócrinos, neurológicos e até câncer. É só você pesquisar, mas a indústria tenta acobertar os fatos.
Em segundo lugar, acho uma questão de vaidade mesmo, no sentido que eu entendo como bíblico, de coisas efêmeras. Todas sabemos que para se arrumar é preciso investir dinheiro (mesmo não consumindo produtos de luxo, vc gasta uma quantia significativa se colocar tudinho na ponta do lápis) Então eu penso no tempo em que trabalhamos só para poder adquirir essas coisas passageiras, é quase impossível não ficar meio refém disso.
Ainda sobre o dinheiro, penso em quantas coisas mais úteis poderíamos investir ao invés de gastar com essas coisas, em missões ou em ajudar os pobres mesmo.

Norma disse...

Lucy, vou aproveitar seu comentário para escrever uma continuação do post, ok?

Abraço!