05 novembro 2013

Dooyeweerd e o conservadorismo

Leio em No crepúsculo do pensamento ocidental (o "ocidental" ficou de fora na capa da tradução brasileira), de Herman Dooyeweerd, p. 132-3, um trecho interessantíssimo sobre o historicismo:

Os fundadores da ciência histórica, sendo amplamente influenciados por essa cosmovisão romântica [a crença de que as nações crescem organicamente, como seres vivos, a partir de sua potencialidade individual já presente embrionariamente], passaram a desenvolver um novo padrão de pensamento científico, o qual foi oposto fortemente ao modo de pensamento matemático e mecanicista da ciência natural. O novo modelo de pensamento foi aplicado à jurisprudência, à teoria política, à economia, à estética e à linguística. A partir desse padrão foi construída uma imagem historicista da realidade, logo amplamente aceita como um axioma. Mesmo vários líderes e políticos cristãos influentes deram boas-vindas à visão historicista, especialmente em sua aplicação à sociedade humana, como um poderoso aliado em sua luta contra os princípios da Revolução Francesa. Eles não perceberam que o historicismo estava enraizado no mesmo motivo básico religioso humanista, que também governou as ideias filosóficas de Rousseau e seus discípulos revolucionários.

Observa o autor que, opondo-se ao racionalismo dos pais da Revolução Francesa, alguns conservadores cristãos se apegaram a esse historicismo inicial, que ainda estava associado à ideia de valores eternos que se realizam temporalmente. Até que o historicismo fez ruir o andar de cima (Schaeffer) e se revelou tal como é - compondo o irracionalismo também materialista e niilista de hoje, pano de fundo comum para a área de humanas.

Lendo esses parágrafos, vem-me à mente que o conservador contemporâneo mais esclarecido talvez tente retornar a esse ponto preciso em que o historicismo se impôs, para restabelecer algo anterior que é visto como positivo. O problema é que o romantismo buscou recuperar uma pessoalidade e uma individualidade que de fato estavam perdidas. Se o conservador simplesmente voltar no tempo, encontrará todos os problemas já existentes no racionalismo naturalista, e simplesmente trocará de ídolos em vez de combatê-los eficazmente.

O conservadorismo sem Cristo (ou com uma cosmovisão cristã insuficiente) traz em seu bojo uma força de impessoalidade que é - com razão! - rejeitada pelo homem moderno. Se as leis que regem a estrutura da realidade não forem apresentadas como criações de um Deus pessoal e amoroso, que encarnou como homem e morreu por nós, não há esperança para o conservadorismo, e o mundo atual optará por um irracionalismo que preserve as diferenças individuais. Somente os que conhecem a Deus como o Senhor pessoal é que poderão evitar ambos os erros: um universalismo que esmaga as individualidades ou um historicismo que as exalta negando todos os universais - esmagando-as do mesmo jeito no final.

Que grande responsabilidade a nossa!

5 comentários:

Unknown disse...

Este é um excelente post. A luta para pensar cristãmente, lançando fora motivos falsos terra é dada para as nossas gerações. Ser incentivado no meio da luta!
(Traduzido pelo Google)

Norma disse...

Thank you, Brad! I am honored to be read by a non speaking Portuguese reader. God bless you in this fight!

Leonardo Bruno Galdino disse...

Norma,

falando estritamente do aspecto econômico aqui, é interessante observar que a Escritura, ao mesmo tempo em que diz que “nunca deixará de haver pobres na terra”, por isso mesmo diz que devemos, "livremente", abrir a mão para o nosso próximo, para o necessitado (Dt 15.11). Ou seja, ao mesmo tempo em que ela preserva a liberdade individual ("livremente"), também nos remete ao sentimento de solidariedade para com o próximo, que, como nós, também foi criado à imagem e semelhança de Deus. Por isso que eu concluo como você: que grande responsabilidade a nossa!

Parabéns pelo texto. Desafiador e esclarecedor.

Abraços!

André Tavares disse...

Norma, pensando a partir da sua reflexão, fica clara a necessidade de que o pensamento conservador retome seu princípio, ou seja, relembre o que conserva. O que é conservado não são estruturas sociais por si, nem mesmo as crenças; o que é preciso conservar é a noção de limites, que um princípio ou instituição não podem ser infinitamente expandidas - que é justamente a premissa progressista de avanço ilimitado. Entretanto, tendo os limites em vista, o progresso sadio e o desenvolvimento das esferas da criação podem acontecer. Seria outra forma de dizer cumprimento do desígnio divino, que aqui, me parece, se encontra com a noção de cosmonomia dooyeweerdiana. Mesmo o desdobramento da história, no sentido bíblico, é "conservador": tem limites dados de antemão, quer dizer, a história caminha para o cumprimento de uma finalidade redentora.

Norma disse...

Sim, a noção dos limites que Deus deu, ou seja, as estruturas, que por sua vez dão identidade a cada elemento da criação.

Mas olha, eu não acredito em um verdadeiro conservadorismo fora de uma concepção cristã realmente bíblica. Pois, se não for assim, o conservadorismo será idolátrico, e se voltará necessariamente para as estruturas criadas como ídolos a serem conservados. Por isso sou radical como Van Til. :-)