28 janeiro 2014

O bem cuidado e o visceral

Que os leitores não se preocupem com meu silêncio. É mais uma daquelas fases que atingem os escritores: vontade de ouvir e ler, mais que de falar. E, aqui, de mostrar músicas.

No meu livro A mente de Cristo, falei dos significados que me evoca a letra de The Carpet Crawlers (ou Crawl - a grafia muda), do Genesis, uma das minhas preferidas de todos os tempos. Esta tarde, ao sentir saudade da música, procurei na bagunça do meu iTunes as duas versões que conheço e tenho: a mais antiga, cantada por Peter Gabriel, e a de Phil Collins, que assumiu os vocais da banda em 1975. E, sem querer, achei uma coletânea do Genesis com uma terceira versão, de 1999, com um ritmo mais moderninho que eu odiei, porque feriu a identidade meditativa da original e remeteu às recentes composições de Collins para os desenhos da Disney. (Mas os dois cantando juntos valeram a gravação.) A presença de Follow You, Follow Me nesse disco (pois é, sou do tempo em que se falava "disco" e ainda estou fiel ao vocábulo) me lembrou de minha infância no final dos anos 1970, quando ouvíamos rádio em casa e eu tinha minhas preferências inclinadas aos beatles separados, Billy Joel e outros hits que tocavam. (Ainda gosto muito de Beatles, juntos e separados, e de Billy Joel.) Curiosa, ouvi-a de novo e descobri que gostava muito de Follow You, Follow Me antigamente, mas hoje a acho boba, popzinha demais - bem como o Genesis de Phil Collins, que tem pouca coisa interessante.

E por que estou contando isso? Porque, aos dezesseis anos, final da década de 1980, eu ouvia na Globo FM (era excelente!) The Carpet Crawlers, versão do Phil Collins nos vocais, de 1977. Gostava tanto que tinha conseguido gravá-la em uma fita cassete, já que fazia parte da programação usual da rádio. Mas só conhecia o segundo Genesis, pouco havia ouvido falar de Peter Gabriel. Tive o Foxtrot emprestado em casa uma época, mas desisti à primeira escuta (não sei por que; não era um problema com progressivos, pois desde criança eu curtia The Wall, do Pink Floyd, lançado em 1979 - se bem que eu só ia até Mother, nunca virava de lado nem ouvia o Disco 2). Quando eu tinha uns vinte anos, um amigo me apresentou com muita empolgação a Carpet Crawlers original, do álbum The Lamb Lies Down on Broadway, de 1974. Acostumada com a outra, não me entusiasmei muito por essa, nem procurei ouvir de novo durante anos.

Hoje, porém, a de Gabriel é de longe a minha preferida. Simplesmente não consigo mais deixar de sentir falta da introdução melancólica, da voz mais imperfeita e gritada, do andamento um tico mais rápido e da bateria progressivamente mais forte, com uma virada irresistível no final. Acho a gravação que eu ouvia na adolescência um tanto mauricinha - Collins canta irretocavelmente, mas sem aquela emoção visceral de Gabriel. Além disso, o baixo é pior: na primeira versão, há uma linha minimalista, duas notas marcadas como o bum-bum de um samba-enredo, mas só no comecinho, quando os instrumentos são poucos e a bateria ainda não entrou; na segunda, o minimalismo atravessa o refrão toda vez e, em comparação, acaba cansando quando se conhece a original.

Era isso. Considerações sobre quando o visceral é melhor que o bem cuidado, como nosso gosto musical muda com o tempo ou como as linhas de baixo devem variar (e para mim devem, sempre - veja Watcher of the Skies, 3:10 a 3:23, uma das mais surpreendentes que já ouvi), deixo-as para o leitor.

17 janeiro 2014

Consonância

Saiu meu artigo na edição de janeiro de Teologia Brasileira! Chama-se A imaturidade nossa de cada dia e traz uma crítica a certo tipo de conservadorismo que tenho visto se levantar no meio protestante brasileiro. Norma Braga criticando posturas conservadoras? Pois é, pois é, pois é! :-)

E, como se tivéssemos combinado, no mesmo número Jonas Madureira afirma a tolerância como "a atitude própria de toda alma robusta" e, em outra publicação, Davi Charles Gomes atesta que firmeza e tranquilidade devem andar de mãos dadas na argumentação, lembrando que, nestes tempos esquisitos de declarações totalitárias em nome do amor, seria bom meditar sobre aquela famosa frase de Voltaire...

A trinca de textos dialoga entre si e se complementa. Sinto-me feliz por recomendá-los juntos aqui. Boa leitura!

 

14 janeiro 2014

Congresso da ANAJURE sobre Liberdades Civis Fundamentais

Dia 12 de março, em Brasília, no auditório do STJ. Que Deus abençoe Uziel Santana e todos os participantes do evento! Inscrições aqui.

10 janeiro 2014

Que tal programar suas leituras para 2014?

Enquanto eu termino meus compromissos com a pós, vou postando os artigos que me chamaram a atenção. Para terminar bem a semana, esta postagem de Allen Porto é imprescindível: Dicas para uma melhor leitura em 2014. Porque quem ama ler também ama ler sobre leitura! Bom final de semana!

09 janeiro 2014

Dá-lhe, Pondé!


Luiz Felipe Pondé não é cristão, mas tem feito a diferença em uma cultura cujo verdadeiro bode expiatório é o cristianismo, e não as autodeclaradas vítimas de sempre. (Para mais sobre o bode expiatório, leia aqui.)

08 janeiro 2014

Fé e razão

Trago hoje uma postagem de meu marido André Venâncio sobre as relações entre fé e conhecimento. Leia um trecho:

[...] a fé é uma dimensão indispensável de todo esforço de conhecimento, sejam quais forem as convicções teológicas do sujeito. Não há uma disputa a cotoveladas de espaço entre a fé e a razão, e sim uma operação conjunta de ambas em todo ato de conhecimento, mas em planos diferentes. Essa ideia faz sentido especialmente à luz da antropologia filosófica de Herman Dooyeweerd.
Essa é especial para quem gosta de epistemologia à luz de Schaeffer, Dooyeweerd e Van Til. Boa leitura!

07 janeiro 2014

Leituras do dia

Sobre consumismo e educação de filhos, da blogueira Camila Furtado, é uma postagem que ilustra o fato importantíssimo de que as mães precisam ajudar os filhos a não se submeterem à tirania dos próprios desejos. Isso é fundamentalmente cristão: desde pequenos, eles precisam aprender o que é a luta contra os impulsos descontrolados.

E, por falar em tirania dos desejos, Crianças francesas não fazem manha, de Pamela Druckerman, é um livro excelente sobre o assunto, além de muito divertido.

Mas será impossível educar um filho para o autodomínio se é outra pessoa que passa a maior parte do tempo com ele. Outra boa descoberta ano passado foi o pediatra José Martins Filho, que trata da "criança terceirizada" (vídeo), procedimento cada vez mais comum hoje. (É pena que ele seja contra a palmada.)

Nem Camila, nem Pamela nem José Martins são cristãos, mas seus questionamentos fazem diferença em uma cultura que aprova a ausência paterna e a compensa mimando os filhos com bens materiais.

 

06 janeiro 2014

Feriado em Natal

Hoje é feriado em Natal! Dia de não fazer nada, a não ser...

...mimar os gatos...

...e ler bons livros!

Uma boa segunda-feira a você!

 

03 janeiro 2014

Powlison e uma oração

Leio em Uma nova visão, de David Powlison, logo no início de um capítulo sobre a Epístola de Paulo aos Efésios:

Este capítulo não é um "comentário" de Efésios. Ele é diferente, foi escrito para pessoas envolvidas nos detalhes do face a face do ministério, como pastores de almas. O próprio livro de Efésios foi escrito por um pastor de almas. Paulo era exegeta e teólogo; primeiro, ele era um homem em Cristo, e então, pastor de todo o rebanho de Deus (em outras palavras, um pregador), e para cada um [ênfase do autor] do povo de Deus (em outras palavras, um conselheiro). Certa vez alguém descreveu Jonathan Edwards da seguinte maneira: "Sua teologia era toda aplicada e sua aplicação era toda teológica." É essa espécie de teologia e aplicação que o livro de Efésios encarna.

Ó Pai, concede à tua igreja que haja mais pastores, exegetas e teólogos que tenham essa visão do "pastor para cada um do povo de Deus". Não só excelentes pregadores e oradores, mas homens que veem através, por assim dizer; homens com profundo conhecimento do pecado humano e do conselho de Deus, sábios no púlpito e fora do púlpito, abençoadores de pessoas únicas tanto quanto das multidões.

Amém!

02 janeiro 2014

Leituras do dia

Artigo de Denis Rosenfield que expõe a desonestidade dos que comparam o capitalismo real a um socialismo que só existe em suas cabeças.

Mais uma resposta de Yago Martins e Felipe Cruz ao Jesus também inventado de Caio Fábio.

Em tempo: a teologia de Caio Fábio, assim como a teologia liberal, nada no mar do esquerdismo, e é por isso que pode ser tão incoerente e ao mesmo tempo conquistar tantos adeptos. Veja, por exemplo, o comentário de um rapaz chamado Ederson Sales à postagem. Ele acredita que Deus está "além do alcance de nossa capacidade intelectual" (confundindo a infinitude de Deus com irracionalismo) e crê que Caio fala

"...do amor incondicional de Deus e sobre a simplicidade de viver o Evangelho liberto de dogmas e estigmas patrocinados por instituições opressoras travestidas de igrejas".

O rapaz acertadamente localizou nos ensinamentos de Caio Fábio três itens obrigatórios em qualquer discurso esquerdista pós-moderno atual: o mito da liberdade sem forma, a criminalização do pensamento lógico e o mecanismo do bode expiatório. A liberdade sem forma deixa o sujeito "livre" para viver do jeito que quiser, para criar suas próprias regras, convencendo-o de que não há regras. A criminalização do pensamento lógico o desobriga da coerência e faz com que ele identifique uma racionalidade "opressora" em todo aspirante a interlocutor divergente: isso explica a aversão de Caio pela sistematização, ao mesmo tempo em que usa dela em algum nível (é impossível fugir). O mecanismo do bode expiatório estabelece que a igreja instituída é "opressora", estratégia que atrai simpatias instantâneas e ainda reúne odiadores em nome do amor. O "amorrrrrrr" serve como justificativa prévia para tudo. É assim que Caio Fábio pode continuar dizendo as maiores barbaridades sobre a igreja instituída e todos aqueles que discordam dele, mas continuar posando como "guru do amor". Porém, que não se enganem seus adeptos: a água que ele está servindo foi buscada no poço das cosmovisões apóstatas, que são irracionalistas, esquerdistas e românticas, mantendo a ilusão da autonomia humana. Ainda falarei mais sobre isso.