03 setembro 2008

Discussões lingüísticas

Gustavo Nagel veio hoje todo faceiro me indicar um post do novo blog de... Caetano Veloso! Pois é, o post trata justamente do assunto da recente discussão que tive com Raquel Nery sobre algumas implicações da lingüística moderna (ou nem tão moderna, já que essas idéias têm pelo menos quarenta anos). O fato é que o post é bom demais e eu não resisti: comentei. Minha felicidade é que, com esse comentário, consegui algo que não tinha conseguido até então com Raquel: resumi praticamente tudo o que penso sobre o assunto. Sintam-se à vontade para continuar debatendo aqui! Abaixo, o comentário, com o link para o post do blog de Caetano.
Olá, Caetano,

Que coincidência receber agora a notícia deste post: estava justamente conversando sobre isso em público, via blogs, com uma professora de lingüística (sou professora de francês e literatura). Em resposta a meus lamentos sobre algumas mudanças no português brasileiro que atentam contra a ossatura do idioma (ou seja, a sintaxe - como "é o carro que você precisa"), ela me acusava de elitismo. Ora, cito você -

"as pessoas que dizem “grobo” são as mesmas que têm vocabulário menor, menos acesso aos conhecimentos, menos poder"

- para afirmar que, se há no estudo do idioma a função descritiva e a normativa, não entendo por que os profissionais de Letras envolvidos na primeira função (os lingüistas) insistem em menosprezar a segunda, negando a necessidade de padrões para os idiomas e transformando a norma culta numa espécie de instrumento de opressão próprio das "classes dominantes" - um marxismo barato transposto para estudos lingüísticos. Além do mais, embora sejam duas funções igualmente importantes, há uma diferença significativa entre elas: a primeira é eminentemente acadêmica (descreve-se para compreender melhor o idioma e produzir teoria), enquanto a segunda gera resultados fora das portas da universidade, na medida em que, através do ensino para um maior domínio da modalidade culta, há um real aumento não só de possibilidades de ascensão social, mas de desenvolvimento pessoal. Quem domina o padrão culto não só angaria mais oportunidades profissionais, mas lê melhor, escreve melhor e, acredito, até pensa melhor. Assim, o resumo de meu argumento é: enquanto os lingüistas pretendem criar para essas pessoas de "menos poder" uma ilha de falso consolo, são os professores de português (os Pasquale da vida) que de fato lhes estendem a mão e as puxam para cima.

Que os lingüistas continuem portanto naquilo que é de sua especialidade - descrever o uso do idioma - enquanto os professores de português fazem o que é de sua competência: ensinar a variante culta da língua. Descrever e normatizar são duas funções diversas, mas ambas possuem relevância. Não é preciso que uma diminua para que a outra cresça.

Seu blog e esse post foram uma agradável surpresa. Parabéns!

Abraços,

Norma

P.S. Manuel Bandeira confessou achar bonitinho quando os cariocas dizem "para mim fazer". Particularmente não gosto, mas tenho especial simpatia pelo fenômeno que você citou na linguagem oral de Minas Gerais: a ausência dos pronomes em determinados verbos ("Ele assustou!"). Ora, podemos de fato apreciar alguns desvios da norma culta (orais ou escritos) sem, com isso, adotar esse discurso populista de nivelamento. Aliás, saber apreciar desvios é uma das condições para a fruição da literatura. Senão, professores de português jamais leriam ou recomendariam Guimarães Rosa! ;-)

31 comentários:

Gustavo Nagel disse...

Norma sem preconceitos.

Norma disse...

Claro. E sempre dando a segunda chance.

Caramba, faltou dizer tanta coisa sobre o assunto. Por exemplo, da minha ira contra a mudança que querem fazer no português escrito: o corte do trema, um acento que funciona. A partir dessa mudança burra, os estudantes de português como língua estrangeira jamais saberão a pronúncia correta do GU de "linguiça", a não ser que tenham em mãos um bom dicionário com notação fonética (e eles são raros! o Aurélio, por exemplo, não traz notação fonética) ou um falante do idioma por perto. Que tristeza.

Pergunto-me então por que profissionais aparentemente mais abalizados que eu para decidir questões ortográficas dessa monta tomariam tal resolução. Preguiça de apertar uma tecla a mais? Também tenho preguiça de pôr trema, mas e daí? É um acento útil: indica a pronúncia e não falha nunca.

Enfim, toda a minha indignação contra transformações tolas na linguagem, não importa de onde venham - se do povo, se das "elites".

Maya Felix disse...

Norma, a reforma ortográfica tem razões muito mais editorias/mercadológicas que outra coisa, e beneficiará, sobretudo, o Brasil, que tem a maior produção editorial lusófona do planeta.

Quanto a "grobo", eu teria muito a dizer, mas já postei tanto sobre isso... Creio que você já ouviu falar na Lei da economia Fonética, nos estudos funcionalistas de Maryinet, na fundação da Fonologia por Jakobson e Trubetzkoy, do Círculo Lingüístico de Praga e outros estudiosos da área e suas teorias. Essas teorias explicam, entre muitas outras coisas, porque em francês se fala quase "véia" (vieille) e em português não-culto, "véia", em vez de velha, que exige mais do aparelho fonador. Essa é uma questão descritiva.

Mas por que, no português falado, "velha" seria mais legítimo que "véia", para quem fala, para quem ouve e para a compreensão do discurso, dentro de determinado contexto? Por que "véia" talvez seja "velha" amanhã? A língua é viva, e, sendo viva, evolui, muda, se transforma (veja o caso desta próclise, mesmo coma vírgula tão próxima...).

Quanto a outros aspectos, como "objetivos da língua" e critérios de eficiência, comunidade de falantes, proficiência linguageira etc.,devo me abster, pois creio que terminaria por escrever uma longa postagem, e enfadonha, e não me dou esse luxo por falta de tempo (não de interesse).

Outra coisa: Norma, você está vendo Marx em todo lugar, atrás da porta e dentro do armário. Eu não vou nem continuar... ;)

Por fim, já que você falou em norma, padrão e correção, me desculpe, não quero parecer pedante, mas a expressão "correta" é "na medida que", e não "na medida em que". O Manual do Itamaraty, por exemplo, é bastante claro sobre isso, posso digitalizar algo e mandar para você.Não se ofenda, foi só uma observação. Muitos insitem nessa expressão, duplicando a preposição. Outros preferem "a nível de"... Mas isso não muda nada! Percebe?

Bom, e sobre o Caetano Veloso... Como lingüista e músico continua sendo um ótimo baiano.

:)

Um abraço,

Norma disse...

Oi, Maya,

Sim, você tem razão quanto a "véia" (e eu mesma sempre digo isso aos alunos) - mas veja, sua perspectiva ao escrever essas coisas é lingüística (logo, descritiva, não normativa). Isso é ótimo. O problema é quando os lingüistas querem colocar a descrição (com as mudanças que o tempo imprime à língua) acima da normatividade. Aí fica sem sentido. As duas pontas da abordagem são necessárias: olho a língua com espírito investigativo e isento para dar conta de suas características E olho a língua como algo ligado a normas sociais, portanto, possuidora de um padrão culto desejável. A briga entre gramáticos e lingüistas simplesmente não procede, é isso que quis dizer. Cada macaco no seu galho.

Bom, como revisora, uso duas expressões semelhantes: "à medida que" e "na medida em que". Não sei quanto à orientação do Itamaraty, mas "na medida em que" me parece lógico por causa da retomada da preposição. (Pois é, a norma culta - não eu, a do português :-D - tem algumas manias esquisitas, de que discordo mesmo.) Já o caso de "a nível de" é diferente, pois trata-se de uma expressão coringa (quase um vício de linguagem) que devemos evitar, substituindo-a por algo mais preciso e que de fato signifique alguma coisa.

Gostei das suas intervenções. Quanto ao Marx, bom, sou uma Flor de Obsessão, você esqueceu? ;-)

Beijos!

Gustavo Nagel disse...

Ver Marx em todo lugar, no Brasil, talvez não seja possível apenas para os cegos.

Norma disse...

Sobre esse negócio de ver marxismo em tudo: na medida em que (não é provocação, viu, Maya? Hehehe!) a norma culta da língua passa a ser considerada meramente um instrumento de opressão das classes dominantes sobre as classes menos favorecidas - uma compreensão muito pobre dos mecanismos lingüísticos - , creio que não há expressão melhor para designar esse deslizamento teórico, a não ser "marxismo barato". Afinal, foi Marx quem inventou a luta de classes e lhe atribuiu o status de característica basilar das sociedades, não é?

O fato é que só há padrões ideais lingüísticos (jamais atingidos plenamente e nem tão consensuais assim, diga-se) porque em toda sociedade (portanto, na vida) há algo chamado HIERARQUIAS. As hierarquias não estabelecem quem é ontologicamente melhor que o outro, mas sim "arrumam" a sociedade e os relacionamentos, estabelecendo diferenças FUNCIONAIS. Quem confunde diferença hierárquica funcional com superioridade ontológica é o típico esquerdista revoltado, o eterno adolescente que odeia os pais, as autoridades, Deus. E é também o machista ou a feminista, por incrível que pareça. (Tenho um texto sobre isso que já já posto.) Para os crentes, essa confusão deveria ser tirada de letra. Mas não é, e essa é uma das funções desse blog: ajudar a restabelecer a verdade nesse ponto. Por isso, sim, é uma de minhas obsessões.

Maya Felix disse...

'Bom, como revisora, uso duas expressões semelhantes: "à medida que" e "na medida em que". Não sei quanto à orientação do Itamaraty, mas "na medida em que" me parece lógico por causa da retomada da preposição. (Pois é, a norma culta - não eu, a do português :-D - tem algumas manias esquisitas, de que discordo mesmo.) Já o caso de "a nível de" é diferente, pois trata-se de uma expressão coringa (quase um vício de linguagem) que devemos evitar, substituindo-a por algo mais preciso e que de fato signifique alguma coisa."

Sim, exatamente. Você chegou aonde eu queria: e daí? Faz sentido, na oralidade, se eu digo “na medida que” ou “na medida em que”? Ambas as expressões não são causais? A preposição agrega sentido? Não, preposição não agrega sentido. Sob que ponto de vista uma expressão é considerada erro e outra não? Aliás, “na medida em que”, até há pouco tempo, era expressão condenada. Não constava da Gramática Normativa. É a Gramática Normativa, que legitima, ou é o uso? E o que a Gramática Normativa incorpora como “uso legítimo”? Quem sabe, de fato, a diferença deveras preciosista e um tanto inútil entre “na medida em que” e “na medida que” (não falo de seu trabalho de revisora , mas da oralidade, do dia-a-dia)? Já ouvi professoras de português, doutoras, defenderem o uso de “na medida que”, em vez de “na medida em que”. Como já ouvi gramáticos atacarem o “a nível de”. Mas a Gramática aprova. E ainda temos “à medida que”, locução proporcional. : P

Discutir essas firulas, ainda que seja interesante num Congresso de Lingüística que trate de variacionismo (Sociolingüística), é um tiro n'água se determinado grupo de pessoas se comunica usando uma ou outra variação lingüística. É como discutir quantos anjos cabem na cabeça de um alfinete.

Maya Felix disse...

"Ver Marx em todo lugar, no Brasil, talvez não seja possível apenas para os cegos."

Ou para os menos obsessivos e mais realistas.

Alguns evangélicos vêem demônios em todo lugar, e passam seus dias a repreendê-los. Já cheguei a ouvir relatos de pessoas que viam demônios em diferentes objetos, distribuídos pela casa: pingüins em cima de geladeiras, calendários com desenhos de Maria, roupas com o símbolo oriental ying-yang e estojos cor-de-rosa com o desenho da Hello Kitty. A literatura médica comenta que casos semelhantes a esses são chamados de TOC (não me refiro à você, em especial, Gustavo, mas ao conjunto da obra aqui descrita).

Norma disse...

Maya, você está usando de uma lógica oito ou oitenta. Há gradações entre os desvios da norma culta. Escrever "na medida em que" é uma coisa, escrever "ascenção" é outra, e, ainda, escrever "para mim fazer" é outra bem abaixo. Como escritora, para discordar da norma culta (como fiz no caso de "na medida em que"), preciso conhecê-la antes de tudo. É o tributo que presto a meu amor pelo idioma.

Repito, enxergar a norma culta como um simples instrumento de dominação é deixar de perceber a necessidade de padrões em tudo. Padrões que mudam, certo, mas que também se movimentam dentro de uma escala de valores. Sou contra toda mudança? Claro que não. A mudança é inerente à evolução da língua. Sou contra algumas e a favor de outras. Para a lingüística, norma e desvio constituem "variações"; para a gramática, é preciso seguir a norma. Cada um em sua função. Poxa, achei que tinha explicado tão bem.

Norma disse...

Bom, Maya, espero que você não considere meu blog um exemplo de TOC.

Maya Felix disse...

"Repito, enxergar a norma culta como um simples instrumento de dominação (...)"

Eu não disse isso... :)

Maya Felix disse...

"Bom, Maya, espero que você não considere meu blog um exemplo de TOC."

Eu não disse isso!

STP, não me interprete mal! Se considerasse seu blog um exemplo de TOC certamente não postaria nada aqui! rs

:)

Bom, vou estudar. Minha hora de folga acabou.

Norma disse...

Ah, faltou dizer: a preposição não agrega sentido, mas "arruma" a língua. Logo, quem não a usa e não entende sua função - ou quem não consegue fazer diferença entre o não-uso oral e o uso escrito - irá escrever um texto "desarrumado".

Norma disse...

Ahn bom, hahahaha!

Vitor Grando disse...

"
Outra coisa: Norma, você está vendo Marx em todo lugar, atrás da porta e dentro do armário. Eu não vou nem continuar... ;)"

Só pra manifestar minha concordância com a Norma. Realmente, o Marxismo está em TODO lugar. Tenho me apercebido isso cada dia mais. Como estudante de Teologia tenho visto Marx do "Método Teológico" ao " Introd. ao Novo Testamento" passando por todas as demais disciplinas. Dá nojo!

Norma disse...

Ih, nos seminários então, Vitor, é um horror. A única vantagem disso (tem que haver alguma, não é?) é que, conhecendo bem tudo isso, você sai de lá mais apto a enfrentar o pensamento secular. As desvantagens (maiores, a meu ver) é que você aprende só o negativo: aprende como NÃO pensar. Enquanto isso, há tanta coisa a ser feita com a cosmovisão cristã adequada. Há todo um mundo de conteúdos a serem desenvolvidos de um modo genuinamente cristão, que ficam paralisados porque só ocupamos nossa mente com o que não presta. Isso me entristece muito.

Edson Camargo disse...

Sobre o pensamento marxista, vale o provérbio chinês: "Não pergunte ao peixe o que é a água".

Melhor conhecer as porcarias, e saber que são porcarias, do que aderir a elas posar de sabido.

Emy Neto disse...

Norma Braga.
Vá até http://www.palavraplenacomunicacoes.blogspot.com E http://www.palavraplenaliterario.blogspot.com ambas do Reverendo Antonio Carlos Costa.
Pax et Bonum.
Prof. Emy Neto.

Vitor Grando disse...

Você está absolutamente certa Norma.
Estudo no Seminário Batista do Sul, um antro de liberais onde qualquer questionamento ao liberalistmo é taxado de "fundamentalismo" e fim de papo. Eu acho, Norma, que as vantagens são maiores, justamente pelo que você falou. Me entristece muito ver o preconceito intelectuamente pobre e não-justificado (isso é o mais irritante!) dos professores contra qualquer visão conservadora. Mais triste ainda é ver como aquela fé cega que muitos alunos tinham na Bíblia é transferida para os professores. A atitude irracional é a mesma, só muda o objeto da crença. A inerrância que era da Bíblia, passa a ser a inerrância dos "doutores". É importante conhecer a fundo essa sujeirada, me motiva a estudar dobrado para combater essas idéias e me conscientiza da importância de formarmos professores de teologia com a "cabeça no lugar" pois é dos seminários que saem boa parte dos líderes da Igreja Evangélica do país.

Anônimo disse...

Olá Norma!

Devo começar agradecendo pela segunda chance ;-) Não esperava que aquele comentário mereceria desdobramentos...
Meu palpite é que Caetano Veloso abordou o tema por causa de uma entrevista do Marcos Bagno (professor da UnB, pesquisador da sociolingüística) à Caros Amigos de fevereiro. Velhos truísmos caíram na grande imprensa e o resultado são polêmicas requentadas. Bagno transformou o fato da variação em uma militância quase panfletária, e o resultado é que os conservadores encontram no tema um alvo fácil para suas críticas. Vejo que muita coisa você já discutiu com Maya, e já não há muito a dizer. De qualquer modo acrescento algumas observações:

Afirmar que os profissionais de Letras envolvidos na primeira função (os lingüistas) menosprezam a função do ensino é um equívoco grave. Não existe essa dicotomia. Os cursos de formação de professores de língua materna têm lingüistas como professores, e não há como dissociar a pesquisa lingüística do ensino de língua materna (e, desde o século XIX, já não há gramáticos que não sejam necessariamente lingüistas). Evidentemente, a descrição não precisa de uma “aplicação” para encontrar sentido ou relevância, e há alguns pesquisadores que não “descem” às questões pedagógicas. Mas os poucos avanços que temos no ensino de português resultam da combinação bem sucedida entre a pesquisa e sua aplicação. Se os lingüistas enxergassem a norma culta apenas como instrumento de dominação não diriam que ela deve ser ensinada na escola pública, nem exigiriam que seus alunos escrevessem de acordo com ela.

A sociolingüística (e suas variantes) é apenas uma das correntes teóricas da lingüística. Uma observação mais cuidadosa mostrará que as tendências de base cognitivista são mais “adequadas” às convicções políticas de direita. Isso não significa que um gerativista, por exemplo, seja necessariamente de direita. Por outro lado, a sociolingüística não tem NENHUMA relação com o marxismo: seus fundamentos epistemológicos e sua metodologia não têm vínculo com o materialismo histórico (a despeito de a variante CLASSE ser absolutamente necessária a qualquer investigação dessa linha). Fazer uso político de uma teoria científica, na minha opinião, é legítimo. Do mesmo modo que é legítimo, por parte de muitos cientistas cristãos, lançar mão das pesquisas de base criacionista com finalidade apologética.

A mudança lingüística (que é diferente da variação) é um fato, não uma teoria. Não adianta “espernear”: a gramática vai incorporando as mudanças (as de que gostamos e as de que não gostamos), e elas sempre começam ao rés do chão dos valores sociais (que ironia!). Por isso a Itália fala italiano e não latim. Pela mesma razão, o português do Brasil tende a variar mais que o de Portugal: temos história, população, processos migratórios, extensão territorial e contexto sócio-cultural muito próprios. Lamentar os efeitos lingüísticos dessa realidade é rejeitar nossa própria identidade como nação. Como pesquisadora de Literatura você certamente lembra que os românticos foram os primeiros filólogos dos vernáculos europeus.

O primeiro registro de que há relação entre língua e poder (ou dominação, hierarquias, valores, arrumações funcionais, como queira...) não partiu de um esquerdista revoltado, mas de Antonio de Nebrija, autor da primeira gramática vernácula espanhola, em cujo prólogo, dedicado à Rainha Isabel, no ano de 1492, afirmou:
"una cosa hallo y saco por conclusión mui cierta: que siempre la lengua fue compañera del imperio: y de tal manera lo siguió: que junta mente començaron. crecieron. y florecieron. y después junta fue la caída de entrambos."
(http://www.geocities.com/urunuela33/nebrija/prologo.htm)

Bem Norma, você já me deu a dica de que estender-se muito em comentários não é de bom tom ;-) Fico por aqui. Abraços!
Raquel

Gustavo Nagel disse...

Chegamos a nos esbarrar no Seminário do Sul, Vitor?

Vitor Grando disse...

Não sei Gustavo, você ainda está lá?
Eu estou no 2º período, a noite.

Norma disse...

Oi, Raquel!

Vamos lá, comentando seus comentários:

Você: "Bagno transformou o fato da variação em uma militância quase panfletária."

Eu: Fico feliz de alguém da área reconhecer isto! Geralmente, ele é considerado uma espécie de herói.

Você: "Afirmar que os profissionais de Letras envolvidos na primeira função (os lingüistas) menosprezam a função do ensino é um equívoco grave."

Eu: Não falei que menosprezavam o ensino, mas sim que tendiam a ver a norma culta como um instrumento de dominação. Tive um professor que afirmava textualmente: "A variante culta é apenas um modo de distinção social." Essa compreensão do fenômeno lingüístico é superficial demais. Tive outra professora que, além de acreditar nisso, passava boa parte do tempo das aulas falando das maravilhas de Cuba. Mas tive também outros professores ótimos. No entanto, como você mesma reconheceu, Bagno é um representante desse modo-de-ser lingüístico que, sob a inspiração de um ideal esquerdista igualitário, quer neutralizar toda normatividade e elevar a variação a um status absoluto (uma atitude idólatra com relação à mudança, diga-se).

Você: "Não adianta “espernear”: a gramática vai incorporando as mudanças, e elas sempre começam ao rés do chão dos valores sociais."

Eu: Você me leu mal ou não me leu por inteiro aqui. Se eu esperneasse com toda e qualquer mudança, nem latim falaria, pois houve idiomas anteriores a ele. Reclamo de mudanças burras, às quais já aludi. Por que a lingüística pede que eu goste de toda mudança? Talvez porque os lingüistas, querendo posar de cientistas, acabam sendo cientificistas. A postura neutra diante da língua não combina com o amor. E, se eu amo a língua portuguesa, reclamarei sempre que estiver diante de uma mudança burra, como o apagamento das preposições dos pronomes relativos ou a retirada do trema.

Quanto a escrever demais, de novo você me leu parcialmente: eu estava falando dos leitores estreantes, não os habituais. ;-)

Abraços!

Norma disse...

Caro Vitor,

Você tem toda razão sobre o "preconceito intelectuamente pobre e não-justificado" acerca do conservadorismo (político, cultural e sobretudo teológico), mas a melhor resposta a esse preconceito é a paciência e a disposição para o diálogo. Às vezes é difícil, eu sei. Há uma barreira gigantesca de rumores, fofocas e opiniões artificiais (não oriundas da experiência). A difamação é uma das armas mais poderosas dos lobbies esquerdistas. Mas agüente firme; muitas vezes vale a pena tentar restabelecer a verdade para quem estiver disposto a ouvir.

Grande abraço!

Redação disse...

Já repararam numa coisa: todos, absolutamente todos, que defendem a norma culta aqui comete atentados graves contra a dita cuja?

Meu deus.

Como podem defender o que não dominam?

Norma disse...

TODOS COMETE atentados graves???

HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!

Obrigada por tornar meu dia mais divertido!!! :-D

Gustavo Nagel disse...

E é preciso ser moralmente perfeito para se admitir as existência de preceitos moral?

:-D

Norma disse...

Pois é, Nagel, a gente sabemos que só hão malucos neste blógs.

QUA QUA QUA QUA QUA QUA QUA

Anna Layse Anglada Davis disse...

Norma, sou aluna da graduação no curso de letras em Belém - PA e sou sua fã! Sempre leio seus posts e, além de aprender e me atualizar em diversas questões, me divirto bastante com seus comentários!
Só queria mesmo lhe dar os parabéns pelo blog e dizer que você pode não saber, mas tem fans escondidos por todo o Brasil. Ah, sou também presbiteriana reformada, daí a minha identificação com as suas posturas morais, políticas, profissionais/acadêmicas e especialmente religiosas!
Com relação a esse último post, então... você não imagina a minha felicidade ao ver que ainda existe alguém com capacidade e entendimento suficientes para ousar defender o que você defende aqui.
Admiro muito o seu trabalho no blog; por favor, não desanime!

Meus sinceros aplausos!

Norma disse...

Anna,

Vou falar como os mineiros: emocionei aqui... :-)

Um abraço enorme!

ROGÉRIO B. FERREIRA disse...

Para os amantes do português, tem um vídeo super engraçado aqui: Pleonasmo